quarta-feira, 30 de abril de 2008

A terra de Cora Coralina


CHAMADA : "Eu sou aquela mulher que fez a escalada da montanha
da vida removendo pedras e plantando flores". Assim pensava a poeta Cora Coralina, que com seu estilo absolutamente pessoal, foi não somente a poeta, mas a grande contadora de histórias de sua terra : Goiás. Embora escrevesse desde muito jovem, a poeta goiana só fez sucesso após os 70 anos de idade, sendo somente conhecida no Brasil, quando completava 90 anos.

“Sou uma mulher da terra”, costumava dizer Cora Coralina, que se achava mais doceira do que escritora. Seus doces cristalizados de caju, abóbora, figo e laranja, encantavam os vizinhos e amigos, e ela dizia que os achava muito melhores do que todos os poemas escritos. Aliais, foi como doceira que conseguiu se sustentar e educar os filhos. Isto porque, Cora Coralina foi a maior parte da sua vida simplesmente uma mulher, ligada aos valores de sua região, à família e a literatura.

Voz viva da cidade de Goiás, Ana Lins dos Guimarães Peixoto Brêtas nasceu no dia 20 de agosto de 1889, na casa que pertencia à sua família há cerca de um século e que se tornaria o museu que hoje reconta sua história, em Goiás Velho. Filha do Desembargador Francisco de Paula Lins dos Guimarães Peixoto e Jacinta Luiza do Couto Brandão, Cora, recebia sua educação feminina em casa, com a professora Silvina. A melhor lembrança que guardava de sua infância eram deliciosas férias que passava na casa do avô. Lá podia livrar-se do duro tratamento que as crianças recebiam em seu tempo de menina: “Criança não valia mesmo nada. A gente grande da casa usava e abusava de pretensos direitos de educação“.

Muito jovem se interessou pela literatura e lia tudo que chegava em suas mãos. Por causa desta paixão acreditava que nunca iria se casar, pois segundo ela na casa da moça romântica “quando o marido chega o fogão está apagado, cinzento, o feijão está cru, esturricado na panela, o menino está sujo, a casa pó varrer e lá está ela, declamando Fagundes Varela, lendo Guerra Junqueiro.” Da leitura para a própria poesia foi um pulo só. Aos 14 anos já criava os seus “escritinhos”, sempre traduzindo a sua paixão pela cores e formas de sua região.

Este romantismo todo, fez com que a poeta escandalizasse sua cidade, ao fugir com o delegado em 1934, com 21 anos, com um homem bem mais velho do que ela e se não bastasse isto, casado e pai de uma filha. O advogado Cantídio Tolentino Bretãs foi a paixão da sua vida. Com ele, foi morar em Jabuticabal, interior de São Paulo, onde nasceram e foram criados seus quatro filhos – Paraguassu, Cantídio, Jacinta e Vicência. Enquanto vivia em São Paulo, criava elegias a sua terra:

“Goiás, minha cidade
Eu sou aquela amorosa
De tuas ruas estreitas
Curtas
Indecisas
Entrando
Saindo uma das outras.”

Em 1922 é convidada por Monteiro Lobato para participar com seus versos regionais da Semana de Arte Moderna. O marido, a proíbe de ir a capital e resignadamente, a poeta aguarda o momento da virada. Este vem em 1934, quando Cantídio morre e para sustentar-se passa a vender doces e livros, pela José Olympio Editora. Muda-se para São Paulo e amadurece seus escritos sobre a literatura, como no poema em que fala sobre como o poeta cria a sua poesia:

“Não é o poeta que cria a poesia.
E sim, a poesia que condiciona o poeta.
Poeta é a sensibilidade acima do vulgar.
Poeta é o operário, o artífice da palavra.
E com ela compõe a ourivesaria de um verso.
Poeta é ser ambicioso, insatisfeito,
procurando no jogo das palavras,
no imprevisto texto, atingir a perfeição
inalcançável.
O autêntico sabe que jamais
chegará ao prêmio Nobel.
O medíocre se acredita sempre perto dele. “

Para Cora Coralina, o valor de sua obra estava justamente na quietude vivida por muitos anos, nas dores e sentimentos de uma vida curtida pelo tempo. Voltou a viver em Goiás em 1956, mais de vinte anos depois de ficar viúva e já produzindo sua obra definitiva. Morava em um velho sobrado, na várzea do rio Vermelho. A porta de sua casa vivia aberta as crianças, amigos, vizinhos e turistas.

O reencontro de Cora com a cidade e as histórias de sua formação abriu as portas do seu espírito criativo. A religião e as festas, a comida típica, as famílias e seus 'causos', tudo era motivo para a escritora poetizar um elo entre o passado e presente da cidade, registrando sua história e fazendo-nos estender as transformações acontecidas na cidade. Como ela dizia: "rever, escrever e assinar os autos do Passado antes que o Tempo passe tudo ao raso".

Nesta época, ainda fazia doces para vender, enquanto aprendia datilografia para preparar suas poesias e apresentá-las aos editores. Cora, que começou a escrever poemas e contos aos 14 anos, cursou apenas até a terceira série do primário, só foi publicar seu primeiro livro Poemas dos Becos de Goiás e outras histórias mais, em 1965, aos 75 anos. Com o lançamento veio finalmente o reconhecimento, de sua poesia como a porta-voz de uma realidade interiorana da terra brasileira, como há muito tempo não se via. O poeta Carlos Drummond de Andrade, surpreendido com a obra de Cora, escreveu-lhe em 1979: "Admiro e amo você como a alguém que vive em estado de graça com a poesia. Seu livro é um encanto, seu lirismo tem a força e a delicadeza das coisas naturais.” Neste livro a poetisa graciosamente de sua condição feminina:

“Vive dentro de mim
A mulher do povo
Bem proletária
Bem linguaruda
Desabusada
Sem preconceitos
De casca-grossa
De chinelinha
e filharada. “

Nos últimos anos de vida, dos 70 aos 90 anos, participou de conferências, homenagens e programas de televisão, transparecendo em cada palavra dita a doçura da alma de escritora e confeiteira.

Em 1984, torna-se a primeira mulher a receber o Prêmio Juca Pato, como intelectual do ano de 1983. Viveu 96 anos, teve quatro filhos, quinze netos e 19 bisnetos, foi doceira e membro efetivo de diversas entidades culturais, tendo recebido o título de doutora "Honoris Causa" pela Universidade Federal de Goiás. Coralina faleceu em Goiânia a 10 de abril de 1985. Logo após sua morte, seus amigos e parentes uniram-se para criar a Casa de Coralina, que mantém um museu com objetos da escritora. Para encerrar, um poema muito bonito Assim eu vejo a vida:

A vida tem duas faces:
Positiva e negativa
O passado foi duro
mas deixou o seu legado
Saber viver é a grande sabedoria
Que eu possa dignificar
Minha condição de mulher,
Aceitar suas limitações
E me fazer pedra de segurança
dos valores que vão desmoronando.
Nasci em tempos rudes
Aceitei contradições
lutas e pedras
como lições de vida
e delas me sirvo
Aprendi a viver. “

Na pedra do seu túmulo está escrito: “não morre aquele que deixou na terra a melodia de seu cântico na música de seus versos”.

terça-feira, 29 de abril de 2008

Ada Rogato

O feminismo e o esporte não têm muito a ver com cachaça, mas foi num rótulo de pinga que a primeira para-quedista sulamericana, a paulista Ada Rogato, tornou-se conhecida popularmente no Brasil. Ao bater o recorde de vôo solo, em 1951, quando percorreu os 51.064 quilômetros que ligam a Terra do Fogo ao Alasca, em apenas 326 horas, foi homenageada com a cachaça a Voadora.O curioso que é nunca se soube se a esportista teve coragem para provar os 47 graus alcoólicos em sua homenagem.
Campeã brasileira de para-quedismo, tendo como marca, 105 saltos e cerca de 5000 horas de vôo. Quebrou três recordes: foi a primeira, na América do Sul, a conseguir um brevê de vôo, em 1935, a participar de uma prova de pára-quedismo noturno e a pilotar um avião Cessna por todo o continente americano.

Nascida no dia 2 de dezembro de 1920, em São Paulo, Ada Leda Rogato foi a primeira mulher a receber a Comenda Nacional de Mérito Aeronáutico, no grau de cavalheiro, a Comenda Asas da Força Aérea Brasileira e o título da FAB de Piloto em Honoris Causa. Em 1952, pilotando o seu avião Brasil, foi sozinha para La Paz, a 4.071m de altura e lá recebeu a condecoração Condor dos Andes, pois até então nenhum piloto tentara pousar naquela altitude com um avião de potência tão baixa. Pelo feito recebeu também a condecoração das Asas da Força Aérea Boliviana. Em 15 de junho de 1956, em missão oficial do governo de São Paulo, viajou para todas as capitais do Brasil, inclusive sobre a floresta amazônica, no pequeno avião sem rádio e sozinha. Durante a sua carreira, conquistou diversas medalhas, em diferentes países.

Como para-quedista, Ada Rogato foi o símbolo da ousadia. Originado nos campos da Segunda Guerra mundial, o para-quedismo é até hoje um esporte ousado, pois apesar das evoluções tecnológicas e aeronáuticas, o enfrentamento de uma altura sobre-humana continua o mesmo. Na época de Ada Rogato, quase não se realizava o para-quedismo ornamental, estes que estamos acostumados a ver nos canais de esporte. A aviadora tinha a mania de realiza-lo em feiras agrícolas no interior de São Paulo e nas Capitais da América do Sul. Saltava de aviões e helicópteros desafiando os céus e os seus companheiros homens.

Ada Rogato faleceu em 1986, e pouquíssimo se sabe de sua vida particular.Como vimos, temos algumas estrelas da aviação em nossa fraca participação do universo dos esportes, porém até hoje, é interditado às mulheres exercer a profissão de pilotos de avião comercial no Brasil.

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Adalgisa Néri

Jornalistas sim, mas primeiro poetas. No século XX as mulheres que conquistaram espaço na imprensa tinham que ser um algo mais do que apenas repórteres de notícias. Adalgisa Néri acumulava o dom para política com a ousadia sedutora de uma grande poeta, conquistando muitos corações, dentre eles o de Getúlio Vargas, com quem teve um affair.

A Deusa, como era chamada por Carlos Drummond de Andrade, nasceu com o nome de Adalgisa Maria Feliciana Noel Cancela Ferreira, no dia 29 de outubro de 1905, Rio de Janeiro.

Aos dezesseis anos casou-se com o pintor e poeta paraense Ismael Néri, por quem era absolutamente apaixonada. Seu casamento era tecido com a poesia de ambos, e em sua casa, recebiam os mais importantes intelectuais e poetas brasileiros da década de 20. Vítima de tuberculose, Ismael Néri morreu em 1934, deixando-a viúva e totalmente arrasada.

Em 1935, dedicou-se a carreira literária e ao jornalismo, na Revista Acadêmica. Neste mesmo ano publica seu primeiro livro, poemas, elogiadíssimo pela crítica. Sobrevivia de artigos, crônicas e traduções, para a José Olympio Editora.
Sua beleza era famosa pelo Brasil e Adalgisa possuía muitos pretendentes, dentre eles o maravilhoso poeta mineiro Murilo Mendes. Apesar disto, casou-se com Lourival Fontes, o chefe do poderoso Departamento de Imprensa e Propaganda -DIP, do Estado Novo. Além de horrendo, Lourival era o responsável pela censura nas artes e assumia publicamente ser um homem de direita. Não obstante considerar-se uma artista de esquerda, Adalgisa esteve casada com ele por 14 anos, e colaborava intensamente o DIP, tornando-se a diretora social da instituição e sendo responsável pela área de relações públicas. Quando Lourival foi nomeado embaixador no México, Adalgisa fez o maior sucesso na elite cultural deste país, tornando-se amiga dos pintores Frida Khalo e Diego Riviera. O casamento terminou em 1953.

Separada, começou sua carreira política, escrevendo para o jornal Ultima Hora a coluna diária Retrato sem toque . Neste jornal, sob a proteção de Samuel Weiner, por 12 anos, defendeu o nacionalismo, atacou personalidades sociais e poderosos políticos, e insistentemente denunciou os subornos do dono dos Diários Associados, Assis Chateaubriand. Em reação a ela, Assis publicou na primeira página do Diário da Noite, uma crítica chamando-a de "cinqüentona devassa, infiel ao corpo, à alma e à decência conjugal”, fazendo referência aos inúmeros casos que a jornalista teve durante os seus casamentos.

Em relação a sua vida amorosa, o caso mais chamativo foi com o presidente Vargas. Adalgisa chegou a dar o endereço do Palácio do Catete para correspondência pessoal.
Em virtude do sucesso da coluna, elegeu-se deputada pelo Partido Socialista em 1960 e 1966, combatendo regionalmente Carlos Lacerda. Apesar de ter sido reconhecida sua honestidade e integridade política, foi cassada pelo AI-5. Ana, sua biógrafa, nos diz que "Ela não tinha medo de brigar com ninguém; quando a cassaram, a Marinha exigiu a devolução da medalha de honra ao mérito."

Após a cassação, Adalgisa viveu em profunda depressão, falecendo em 1980, aos 74 anos, num asilo, Estância São José. As últimas mensalidades do quarto com direito a refeições, foram pagas por Flávio Cavalcanti, seu amigo no fim da vida. Adalgisa havia sido jurada no programa de auditório de Cavalcanti.

Famosa por sua beleza, Adalgisa legou para nós poesia de muita sensualidade, como esta, dedicada as amantes:

“Eu te amo
Antes e depois de todos os acontecimentos
Na profunda imensidade do vazio
E a cada lágrima dos meus pensamentos.
Eu te amo
Em todos os ventos que cantam,
Em todas as sombras que choram,
Na extensão infinita do tempo
Até a região onde os silêncios moram.
Eu te amo
Em todas as transformações da vida,
Em todos os caminhos do medo,
Na angústia da vontade perdida
E na dor que se veste em segredo.
Eu te amo
Em tudo que estás presente,
No olhar dos astros que te alcançam
Em tudo que ainda estás ausente.
Eu te amo
Desde a criação das águas,
desde a idéia do fogo
E antes do primeiro riso e da primeira mágoa.
Eu te amo perdidamente
Desde a grande nebulosa
Até depois que o universo cair sobre mim
Suavemente.

domingo, 27 de abril de 2008

Adalgisa Cavalcanti, a primeira deputada de Pernambuco

Desde março vimos acompanhando passo a passo a história da conquista da mulher brasileira por um espaço político. Seguindo uma certa cronologia, já falamos da primeira prefeita do Brasil e nas próximas semanas vamos destacar a história de algumas deputadas que abriram o caminho para os dias atuais.

Com a década de 40, começaram a surgir algumas líderes ligadas ao Partido Comunista do Brasil. Apesar de várias delas não serem filiadas, a primeira preocupação destas mulheres era a luta pela paz; em segundo lugar, a luta contra o aumento do custo de vida e em defesa do abastecimento, e finalmente, em terceiro lugar, a defesa pelos interesses das mulheres. Assim, em 1949, foi fundada a Federação de Mulheres do Brasil, órgão que orientava várias associações de bairros e outras organizações menores. Nesta época, circulou nacionalmente o jornal Momento Feminino, dirigido por Arcelina Mochel.

Nascida em 28 de julho de 1907, na zona rural de Canhotinho, Agreste, filha de pequenos criadores e proprietários de terra, perdeu a mãe aos 11 meses, sendo criada por tios.Do seu pai adotivo, recebeu as primeiras influências de vida. Ele era comerciante, ateu e gostava de política. Entretanto, Adalgisa só cursou o primário. O seu primeiro emprego foi numa casa comercial de rádios e fogões.

Com a eclosão do movimento da Aliança Liberal, em 1930, Adalgisa apoiou o movimento e passou a se interessar pela política. Participou da comissão de solidariedade aos presos políticos, após o levante comunista de 1935. No ano seguinte, foi presa pelas forças policiais e permaneceu quatro meses detida na Colônia Penal do Bom Pastor.

Em 1945, com o fim do Estado Novo e a legalização do Partido Comunista Brasileiro (PCB), filiou-se a este partido, integrando a Célula 13 de maio.
Candidatou-se à Câmara Federal e à Assembléia Legislativa do Estado de Pernambuco na eleição de 2 de dezembro de 1945, concorrendo pela legenda do PCB. Embora não tivesse obtido votos suficientes para eleger-se deputada federal, Adalgisa Cavalcanti conseguiu se eleger deputada estadual com 3 205 votos, sendo a primeira mulher a ocupar uma cadeira na Assembléia Legislativa da história do estado. Durante o seu mandato, Adalgisa propôs que a Assembléia autorizasse o Estado a conceder abono familiar às mães que exerciam cargo público.

Contudo, a sua promissora carreira política foi abortada em maio de 1947, quando o Supremo Tribunal Federal, decidiu cassar o registro do Partido Comunista Brasileiro. Em janeiro de 1948, completaram-se as medidas que levaram o PCB à clandestinidade.

Nos anos que se seguiram à cassação, Adalgisa foi presa por nove vezes, mantendo-se firme nas suas convicções. Participou do amplo movimento social contra à carestia e pela paz, que eram bandeiras comunistas.

Faleceu em Recife, no dia 26 de abril de 1998, em conseqüência de uma isquemia cerebral, aos 96 anos de idade. Seu corpo foi velado na Assembléia Legislativa. O seu velório foi um dos mais solitários, segundo o escritor José Mário Rodrigues. Apenas três sobrinhos e duas senhoras amigas. Foi enterrada no Cemitério de Santo Amaro, com a bandeira do PC em cima do caixão.

sábado, 26 de abril de 2008

ADELAIDE CÂMARA a musa do espiritismo no Brasil

Aura Celeste musa espiritualista do Brasil do início do século XX, assombrou o país por ter sido capaz de se bilocar, ou seja, estar presente em dois lugares ao mesmo tempo, para por à serviço de doentes e desvalidos, os seus poderes mediúnicos de cura e premonição. Encarnada com o nome de Adelaide Augusta Câmara, na cidade de Natal, em 11 de janeiro de 1874, chegou ao Rio de Janeiro em 1896, para ocupar um lugar privilegiado na religião espírita brasileira.

Começou a vida como professora no Colégio Ram Williams. Sua paixão pela educação era tanta, que além da escola organizou em sua própria residência, um curso primário, onde muitos homens ilustres do meio político e social brasileiro aprenderam com ela as primeiras letras. Dois anos após a sua chegada, começou a sentir a sua mediunidade, ou seja, a sua capacidade de se comunicar com o mundo dos desencarnados. Sob a orientação do mestre espírita Bezerra de Menezes, iniciou a sua formação como psicografa, fazendo conferências públicas e dando conselhos que a tornariam famosa.

Adelaide Câmara defendia em todas as sua obras, a idéia de que os Espíritos nos rodeiam, bem como o Ser transcendental que nos criou. Tomar contato com estas entidades, é caminhar em direção a própria libertação, através da iluminação de nossa consciência e do respeito às particularidades de cada ser habitante no mundo.
Como se realiza entre processo de aprendizado e fé? Através de sessões de materialização, onde os seres iluminados por seu poder mediúnico, recebem o seu espírito protetor e com isto, são capazes de ver a verdade que está no princípio de tudo.

Como somos seres reencarnados, devemos em cada existência física, nos dedicar a depurar o nosso espírito e as nossas práticas em relação ao outro. Progressista, esta religião crê na capacidade do homem se desenvolver sempre, principalmente a partir do momento em que morremos. Neste momento, temos conservadas as individualidades da alma, e na próxima vez que viermos ao mundo, vamos nos enfrentar com todas as ações que realizamos no passado, sejam elas boas ou ruins, de modo a estarmos sempre progredindo.

Adelaide Câmara acreditava na idéia que a morte é uma passagem do mundo das formas para o mundo das essências. Neste sentido, a paz com a nossa consciência, o perdão, o esquecimento da ofensa e o desapego material, nos ajudam a desligar do corpo físico, e a estar em harmonia com o todo.

Até 1906, propagava suas idéias no Centro Espírita Ismael, ganhando uma auréola de prestígio, nos somente dos crentes, mas da imprensa.Neste ano, casou-se e como a maioria das mulheres de sua época, afastou-se dos centros espíritas para dedicar-se ao lar e a educação dos filhos. Em casa, implementou a sua vocação literária e criou obras que foram fundamentais para a propagação do Espiritismo no Brasil, o livro “Do Além”, com 21 fascículos.

Foi neste momento que adotou o pseudônimo de AURA CELESTE, nome com que ficou conhecida no Brasil inteiro.

Com as filhas crescidas, retorna aos trabalhos mediúnicos em 1920, desta vez em uma parceria única com o renomado Dr. Joaquim Murtinho. Através de seu intermédio espiritual, o médico começou a curar enfermos desenganados e outros necessitados.
Além das mediunidades de incorporação e vidência psicográfica, muitos autores espiritistas se referem à capacidade de bilocação de Áurea Celeste. Ou seja, o seu poder de estar presente em diferentes lugares do Brasil ao mesmo tempo promovendo a cura de pacientes, através de um “desdobramento fluídico”. Este fato foi registrado em Juiz de Fora e Corumbá.

O assombro que causou em sua época, se deve também ao seu enorme talento de comunicar o Espiritismo, através da poesia e de impressionantes obras lítero-doutrinárias.

Em 1927, fundou o Asilo Espírita “João Evangelista”, destinado a meninas e mulheres carentes. No discurso de inauguração da casa, disse que – “ser mãe de órfãos, graça do céu que não trocaria por todo o ouro e todas as grandezas do mundo”. Daí por diante, dedicou, todo o seu tempo a essa obra de caridade, propagando as luzes do seu saber e de sua bondade até o dia em que serenamente entregou a alma a Deus, no dia 24 de outubro de 1944, no Rio de Janeiro.

Como o pseudônimo que escolheu para si, Áurea Celeste, a vida desta mulher foi uma escada de luz, realizada através da fé e do amor ao próximo.

sexta-feira, 25 de abril de 2008

Alzira Soriano

Lembrando as nossas leitoras da coluna História feminina, estaremos nos meses de abril e maio falando sobre as mulheres na política brasileira. Como não poderia deixar de ser, vamos buscar no nosso passado aquelas personalidades que abriram caminho para as candidatas de hoje.
Segundo o IBGE, as mulheres atravessaram a política em momentos históricos, antes de se afirmarem como lideranças. Vejamos alguns deles:

1822 - A arquiduquesa da Áustria e imperatriz do Brasil Maria Leopoldina Josefa Carolina assume a regência, na ausência de D. Pedro I, que se encontrava em São Paulo. A imperatriz envia-lhe uma carta, juntamente com outra, de José Bonifácio. Ela exige que D. Pedro proclame a independência do Brasil e, adverte: "O pomo está maduro, colhe-o já, senão apodrece."

1893 - Na Nova Zelândia, as mulheres conquistam o direito ao voto pela primeira vez na história.

1917 - A professora Deolinda Daltro, fundadora do Partido Republicano Feminino em 1910, lidera uma passeata que exige a extensão do voto às mulheres.

1928 - Juvenal Lamartine, governador do Rio Grande do Norte, altera a lei eleitoral e dá o direito às mulheres de participar de um pleito. Elas vão às urnas, mas seus votos são anulados. Assim mesmo, é eleita a primeira prefeita do Brasil: Alzira Soriano de Souza, no município de Lages/RN. ( falaremos sobre ela neste artigo)

1932 - Getúlio Vargas promulga o novo Código Eleitoral e garante finalmente o direito de voto às brasileiras.

1933 - Nas eleições para a Assembléia Constituinte, são eleitos 214 deputados e uma única mulher: a paulista Carlota Pereira de Queiroz.

1974 - A argentina Izabel Perón torna-se a primeira mulher presidente.

1979 - Eunice Michilles, então filiada ao PSD/AM, torna-se a primeira mulher a ocupar o cargo de senadora, por falecimento do titular da vaga.

1988 - O "lobby do batom", liderado por 26 deputadas federais, garante a igualdade de direitos e obrigações entre homens e mulheres na Constituição Federal.

1990 - É eleita a primeira mulher para o cargo de senadora: Júnia Marise, do PDT/MG.

1994 - Roseana Sarney é a primeira mulher eleita governadora de um estado brasileiro: o Maranhão. Consegue reeleger-se em 1998.

1996 - O Congresso Nacional institui o sistema de cotas na Legislação Eleitoral. Ele obriga os partidos a inscrever, no mínimo, 20% de mulheres nas chapas.

1997 - As mulheres ocupam 7% das cadeiras da Câmara dos Deputados, 7,4% do Senado Federal e 6% das prefeituras do país, em um total de 302 municípios. O índice de vereadoras eleitas aumenta de 5,5%, em 92, para 12%, em 96.

1998 - A Senadora Benedita da Silva é a primeira mulher a presidir a sessão do Congresso Nacional.

1999 – Martha Suplicy é eleita prefeita de São Paulo

A política é uma atividade de organização da vida coletiva. Essa atividade gira em tomo do poder, que é a capacidade de dirigir as ações alheias e organizar as relações sociais. Isto significa que o poder político ,é o que coordena todas as formas de convivência humana. É também o poder político que coordena e legitima o exercício de poder .



Em 1917 Deolinda Dalto liderou uma passeata de 84 "sufragettes", no Rio de Janeiro, que reivindicou para a população feminina o direito de voto. Em 1918, Berta Lutz propõe a criação de uma Associação de Mulheres, visando centralizar os esforços para intensificar a luta pelo voto.

Em 1928 que Juvenal Lamartine, Governador do Rio Grande do Norte, inspirado na aprovação do projeto de lei pelo Senado que dispunha a capacidade eleitoral da mulher aos 21 anos, antecipou-se a União e introduziu na Constituição do seu Estado a alteração da Legislação Eleitoral, proporcionando as mulheres o direito ao voto. Embora as mulheres tenham votado, seus votos foram anulados pela Comissão de Poderes do Senado. Nesse mesmo ano e no mesmo Estado, Rio Grande do Norte é eleita a primeira Prefeita do Brasil: Alzira Soriano de Souza, pelo Município de Lages.
Não sendo mais possível segurar o processo de pressão desencadeado em favor do voto da população feminina, em 1932, o Governo Vargas, promulgou o novo código eleitoral, garantindo finalmente, o direito à mulher votar.
No ano seguinte, nas eleições convocadas para Assembléia Constituinte, foi eleita a primeira mulher deputada federal Carlota Pereira de Queiroz, médica paulista e Berta Lutz, cientista e feminista, a primeira suplente pelo Distrito Federal. Almerinda Ganla foi eleita entre os 40 delegados classistas (trabalhadores e empregados) em 1935 e Maria do Céu Pereira Fernandes foi eleita a primeira deputada do Rio Grande do Norte. Elas garantiram no seu processo de luta na vida política que pela primeira vez a Constituição Brasileira consagrasse o princípio de igualdade entre os sexos, o direito do voto feminino, além das garantias de proteção ao trabalho da mulher.
A Constituição de 1937, outorgada por Vargas, manteve a igualdade entre os sexos, estabe1ecida em 1934.
A Constituição de 1946 embora tenha sido a mais avançada das constituições, nenhuma mulher foi eleita.

Em 1962 com o trabalho direto de Romy Medeiros da Fonseca e Orminda Bastos, o Congresso Nacional aprovou e Goulart sancionou a lei 4.121 que modificou o Código Civil ampliando os direitos da mulher casada.

Em 1967 com a nova Constituição, as mulheres não avançaram nem retrocederam.
A Constituição de 1988, reflete o avanço da organização e da luta das mulheres. É considerada hoje uma das Constituições mais avançadas do mundo em relação a população feminina, tendo incorporado as reivindicações do movimento feminista de forma a garantir na forma da lei um certo patamar de igualdade social entre homens e mulheres.
A partir de então, embora aquém do esperado, as mulheres começaram a se eleger para o Senado, para a Câmara Federal, Assembléias Legislativas, Câmaras Municipais e postos executivos: Prefeitas e Vice - Prefeitas em quase todos os Estados Brasileiros. No Maranhão, uma mulher elegeu-se Governadora.
Muitas são as transformações que estão ocorrendo na nossa sociedade, mas não significa que tenhamos conseguido uma total e real igualdade de condições e oportunidades como os homens, principalmente na política.
Em nosso país, as mulheres constituem na maioria do colégio eleitoral porém, ainda não têm a mesma possibilidade de ascender aos cargos públicos que os homens, que vem sedimentando a sua participação política há muitas décadas. Para equacionar esta lacuna e aumentar o índice de participação política da mulher, alguns países adotaram o sistema de cotas. Inspirado neste exemplo, e em resposta as pressões do movimento feminista, recentemente o Congresso Nacional aprovou uma lei que estabeleceu normas para as eleições municipais, fixando cotas percentuais de mulheres candidatas em cada partido .
Essa medida representou um avanço no debate sobre a necessidade de se garantir a participação igualitária da mulher nas esferas de poder, assim como o início do pagamento da divida social para com a população feminina .
O resultado dessa conquista, já foi bastante expressivo nas ultimas eleições com aumento do número de mulheres nas listas de candidatos dos partidos ou das coligações.
No entanto, a necessidade de organização e luta das mulheres ainda se colocam fundamentais tanto para garantir as conquistas até agora conseguidas, como também para ampliá-las, um dos requisitos básicos para a capacitação política da população feminina em geral e para as candidatas em particular, é o reconhecimento da trajetória do movimento feminista e de luta na busca constante da equidade social. Votar e ser votada em condições iguais a dos homens é uma delas .

Pioneira foi impedida de tomar posse em 1928

Alzira Soriano de Souza venceu eleição em Lages, no Rio Grande do Norte, mas não levou

A primeira prefeita brasileira foi eleita há 58 anos, em 1928, na pequena Lages, no sertão do Rio Grande do Norte, na mesma região que neste ano fez o maior número de prefeitas, o Nordeste. Alzira Soriano de Souza não exerceu o mandato, porém.

A Comissão de Poderes do Senado impediu que a prefeita eleita tomasse posse e anulou os votos de todas as mulheres da cidade. A participação de mulheres na eleição fora autorizada excepcionalmente graças à intervenção do candidato a presidente da província, Juvenal Lamartine. O Rio Grande do Norte foi o único Estado a permitir que as mulheres fossem às urnas naquele ano.

Outra nordestina, Joana da Rocha Santos, foi a primeira prefeita a cumprir o mandato, apesar de não ter sido eleita pelo voto popular. Noca, como era conhecida, foi nomeada pelo governo federal em 1934 para ser prefeita de São João dos Patos (MA). Joana foi prefeita por 16 anos consecutivos, até bem depois do fim do Estado Novo. Em 1954, ela voltou à prefeitura da cidade, desta vez pelo voto popular.




A primeira mulher a ocupar um cargo eletivo, na América do Sul em 1929, foi a prefeita do município de Lages, Alzira Soriano. Ao seu lado várias outras mulheres foram eleitas e empossadas.
Em 1945, Alzira Soriano elegeu-se vereadora e até 1958 liderava a bancada da UDN. Mas só em 1932 é que a mulher brasileira conquistou, definitivamente, o direito de voto, no Brasil. Carlota Pereira Queiroz, médica, tornou-se a primeira representante feminina no Congresso Nacional. Berta Lutz foi a Segunda mulher a ocupar uma cadeira na Câmara Federal. Em 1950, Ivete Vargas, com 22 anos de idade, foi eleita deputada Federal pelo PTB. Reelegeu-se em 54, 58, 62 e 66. Foi cassada pelo Regime Militar e com a anistia elegeu-se novamente Deputada em 1982.
Nancy Novaes, Nita Costa, Nisia Carone, Maria Lúcia Araújo, Lígia Doutel de Andrade e Júlia Steibruch foram deputadas federais na década de 60. Na década de 70, as mulheres voltaram ao poder. Em 78 elegeu-se pela primeira vez, suplente ao senado, pelo estado do Amazonas, Eunice Michelis, que assumiu em 80, com a morte do titular. Em 78 foram eleitas quatro deputadas federais. Na década de 80 o MDB foi o partido que mais elegeu mulheres para a Câmara Federal e Assembléias Estaduais, 3 federais e 16 estaduais.
Representada por 26 mulheres a Assembléia Nacional Constituinte recebeu propostas de grande importância para a Carta Magna. Em 1994, 869 mulheres se candidataram a cargos eletivos no país. Neste ano foram eleitas 82 deputadas estaduais, 32 deputadas federais e 3 senadoras. Benedita da Silva, do PT, é a primeira negra na História do Senado Brasileiro. Em 98 a bancada feminina Federal diminuiu, mas cresceu nas Assembléias Estaduais. Com algumas suplentes assumindo, a Câmara Federal conta atualmente com 30 deputadas e o Senado com 6 senadoras.

Apesar de reduzida essa representação é expressiva se comparada com os outros poderes: executivo e judiciário.
A primeira prefeita brasileira foi eleita há 58 anos, em 1928, na pequena Lages, no sertão do Rio Grande do Norte, na mesma região que neste ano fez o maior número de prefeitas, o Nordeste. Alzira Soriano de Souza não exerceu o mandato, porém.

A Comissão de Poderes do Senado impediu que a prefeita eleita tomasse posse e anulou os votos de todas as mulheres da cidade. A participação de mulheres na eleição fora autorizada excepcionalmente graças à intervenção do candidato a presidente da província, Juvenal Lamartine. O Rio Grande do Norte foi o único Estado a permitir que as mulheres fossem às urnas naquele ano.

Outra nordestina, Joana da Rocha Santos, foi a primeira prefeita a cumprir o mandato, apesar de não ter sido eleita pelo voto popular. Noca, como era conhecida, foi nomeada pelo governo federal em 1934 para ser prefeita de São João dos Patos (MA). Joana foi prefeita por 16 anos consecutivos, até bem depois do fim do Estado Novo. Em 1954, ela voltou à prefeitura da cidade, desta vez pelo voto popular.

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Antonieta de Barros

A primeira prefeita negra do Brasil nasceu no Sul do país, terras hoje conhecidas pela influência e colorido europeu.

Filha de um jardineiro e de uma lavadeira, Antonieta de Barros nasceu em Florianópolis, no dia 11 de julho de 1901. Nesta época, o destino de meninas pobres e modestas, era ser empregada de famílias poderosas e no campo da política quem mandava eram os homens, todos brancos, é claro.

Ainda menina perdeu seu pai e sua mãe, para aumentar os seus recursos, transformou sua casa em uma pensão para estudantes, em 1917. Esta foi a oportunidade para que Antonieta começasse os estudos e como demonstrou logo cedo um grande interesse pelo aprendizado, foi aceita em uma escola da região para cursar o estudo fundamental. Em 1921, ingressou na Escola Normal Catarinense. Tal curso só foi possível com o auxílio de amigos da família, pois já não contava com o pai, morto alguns anos antes. Mas para a menina Antonieta, aquela não era apenas a oportunidade de conseguir um emprego cobiçado por moças pobres como ela. Na verdade, foi o início de uma das mais legítimas vocações de educadora de que temos notícia no Brasil. Antonieta continuaria ensinando até o fim de sua vida.

Quando se formou, criou o Curso Particular Antonieta de Barros, com a convicção de que o ensino era a condição de libertação das pessoas pobres. Foi também professora, de português e de psicologia, no Colégio Coração de Jesus, no Colégio Dias Velho e no Colégio Catarinense. Foi diretora do Colégio Dias Velho e do Instituto de Educação, no período de 1937 a 1945. Em diversos discursos dizia que a educação era o caminho para o futuro:
“Educar é ensinar os outros a viver; é iluminar caminhos alheios; é amparar debilitados, transformando-os em fortes; é mostrar as veredas, apontar as escaladas, possibilitando avançar, sem muletas e sem tropeços; é transportar às almas que o Senhor nos confiar, à força insuperável da Fé”.
Ides ensinar pequeninos.Ensinai-os, pelo exemplo, a ser bons, sem ser tímidos; a ter a coragem da lealdade, sem ser indelicados; a ser valentes, na defesa da própria felicidade e na do próximo, sem a estreiteza do egoísmo.
Não deixeis que a raça, a cor, a fortuna e todos esses ridículos nadas em que se perdem, muitas vezes, as criaturas, sejam traços de distinção, entre os pequeninos que o Senhor vos confiar.
Socializai a criança, fazendo-a viver convosco as virtudes de que sereis pregoeiras, a fim de que cada uma aprenda que as nobres ações só refletem a beleza quando praticadas por um imperativo de consciência.
Aqui, abençoando-vos, com abundância d’alma, a vossa Amiga de sempre deixa-vos ir, saudosa, mas tranqüila e confiante, porque sabe que haveis de pontilhar de luz a vossa caminhada, transformando-a numa esplendorosa Via Láctea, para, sob o olhar da Providência, mais engrandecer o Brasil, dentro de Santa Catarina.
O Lar e a Escola são as oficinas onde se formam e se aprimoram os caracteres. A ambos, pois, cabe, dentro da sua linda e soberba finalidade, preparar e adestrar o espírito do que, inevitavelmente, entrará, amanhã, no grande combate, que não só abate os fracos, mas também os desprevenidos.
Só o conhecimento da ciência da vida permite ao homem fugir das paixões negativas que proliferam lá fora, onde as competições se chocam e os homens se entredevoram.
E, se, pelo desamor ou – incúria dos que nos deveriam guiar – penetramos na grande luta, sós, olhos vendados, ignorantes da dissimulação do ataque e da ginástica da defesa, quantas quedas e como os desencantos se encastelam em o nosso caminho!...
Em meio aprendizado, apenas, já se sente a alma cansada, magoada, dolorosamente envelhecida, em farrapos...
E forte e privilegiado é o que não sucumbe vencido, e se deixa ir, arrastado no grande turbilhão...
Que se inicie cada criança no conhecimento dos deveres, inerentes à sua condição de humano. Não é bastante dizer-se humano: é preciso sê-lo realmente, agindo com a preocupação elevada de alcançar, na aurora de amanhã, um pouco mais do ar e da luz, que hoje se obteve. Isto, porém, sem acotovelamento, dentro dos limites da sua individualidade, sem ferir ou negar direitos de outrem.
O bem estar, entre os humanos, só será duradouro quando houver conhecimento da individualidade própria e o respeito pela do próximo.

Que os pequeninos conheçam o veneno que destila a lisonja, a bajulação, armas dos incapazes, dos que necessitam de muletas; que aprendam a repudiar os ginastas das espinhas flexíveis e, sobretudo, que não se deixem vencer pela vaidade – o mais tolo dos sentimentos, capaz de esbater e apagar todas as virtudes.
Que se mostre aos pequeninos, com a luz do coração e da experiência, "o caminho por onde devem andar", ensinado-lhes que todas as estradas são pedregosas e há espinhos em todas as veredas, mas que, por ser cada criatura o deus da sua trajetória, é seu dever imperativo a realização do divino milagre – tanto mais admirável quanto mais difícil: transformar em frutos e flores as pedras e os espinhos encontrados na dolorosa "senda de curvas estreitas".


Ser professora era o seu principal talento, mas Antonieta não parou por aí.
Em 1926, fundou o periódico "A Semana", colaborou com o jornal "A República", de 1931 a 1936, escrevendo crônicas com o pseudônimo de Maria da Ilha. Em 1937, publicou a primeira edição de um livro de crônicas, "Farrapos de Idéias", o mesmo título de sua coluna em "A República". A renda do livro foi destinada ao abrigo dos filhos de leprosos da Colônia Santa Tereza, conhecido como "Filhos de Lázaro".

Com a nova Constituição de Getúlio Vargas, em 1934, Antonieta concorreu à eleição para a Assembléia Legislativa do Estado e foi eleita, em 1935. Seu mandato foi até 1937, pelo partido Social Democrático (PSD). O interessante é que Antonieta não se dizia feminista, mas pregava que a mulher deveria deixar de depender do homem e conseguiria sua independência através do estudo.

Em1951, ela deixou a política, morrendo no dia 18 de março de 1952, no Hospital de Caridade. Tinha apenas 51 anos. Não se casou, nem teve filhos. O jornal "O Estado" noticiou: "A capital do Estado foi ontem abalada com a dolorosa notícia do falecimento da Exma. Sra. Antonieta de Barros, que dias antes fora internada no Hospital de Caridade. A notícia de imediato se propalou por toda a cidade, provocando a maior consternação." Foi sepultada no Cemitério São Francisco de Assis.

quarta-feira, 23 de abril de 2008

Bengell e o cinema de 60

Continuando nossa viagem no universo das cineastas, vamos falar das mulheres que fizeram o nosso cinema nas décadas de 60 e 70. Apesar de pertencerem a uma geração em que as meninas sonhavam em casar, Zélia Costa, Helena Solberg e Vanja Orico, fizeram um algo mais pela história feminina brasileira.

Antes, porém, é preciso saber que no anos 50 houve uma ampliação do mercado de trabalho de mulheres na área cinematográfica, em virtude da industrialização do cinema, levada a cabo pela companhia paulista Vera Cruz. As mulheres passaram a exercer funções técnicas como script-girls, montadoras, etc, ao mesmo tempo, que estrangeiras, principalmente duas italianas, nos ensinavam a desempenhar funções especializadas.

A cineasta Maria Basaglia que chegou ao Brasil em 1956, já com larga experiência no teatro e no cinema da Itália, causou estranhamento ao dirigir dois filmes com caráter étnico, Macumba na alta e O pão que o diabo amassou, este em 1958. Com o insucesso dos filmes, dedicou-se com o marido, o italiano Marcelo Albani, ao estúdio de som Odil Fono Brasil, até a volta para a Itália em 1964. Carla Civelli, outra italiana, chegou ao Brasil em 1947 e, rapidamente, integrou-se ao círculo de empresários e intelectuais que impulsionava o movimento cinematográfico de São Paulo, como Assis Chateaubriand, Franco Zampari, Pietro Bardi e Almeida Salles. Além de dirigir É um caso de polícia (1959), Carla participou da equipe de montagem da companhia Vera Cruz e do departamento de corte da Cinematográfica Maristela. Também produziu o teleteatro que Cacilda Becker apresentava na TV Tupi e coordenou as equipes de dublagem do estúdio Cinecastro.

Para o cinema, os anos 60 no Brasil serão absolutamente inovadores. Surge uma crítica intelectualizada que expressa a potência dos jovens cineastas do Cinema Novo. Contudo, a inquietação explosiva do movimento não contemplou as mulheres. As testemunhas não condenam (1962), de Zélia Costa, consta como única direçã de um “longa” feminino da década. Zélia ocupou funções técnicas na Vera Cruz e supõe-se que tenha sido co-montadora do filme Os cafajestes (1962), de Ruy Guerra, que é uma obra prima estrelada por Norma Bengell, absolutamente exuberante e Jece Valadão, totalmente canastrão.

Com a criação de cursos universitários e implementação do Instituto Nacional de Cinema, no início da década, houve a organização de clubes de cinema, revistas especializadas e festivais para amadores, que estimularam a produção de filmes de curta-metragem e a estréia de algumas diretoras. É neste período que Helena Solberg inicia sua carreira, de documentarista, comprometida com a ótica feminista. Seu primeiro filme, A entrevista (1966), é um questionamento dos valores burgueses presentes na educação das mulheres. Recentemente fez um filme de grande sucesso, Banana is my Business, sobre a vida de Carmem Miranda. Todavia, será na seguinte, que surgirá uma produção significativa com assinaturas femininas.

Os anos 70 registram o maior índice anual de produções brasileiras. A realização de filmes de curta-metragem também foi beneficiada, através de uma legislação especial para exibição em cinemas. Um grande número de realizadoras começa a atuar nesta época. Ana Carolina, Suzana Amaral, Tereza Trautmam e Tânia Savietto, dentre outras, dirigiam curtas e assinava longas. Em 1973, tanto a atriz Vanja Orico, a Maria Bonita de O cangaceiro (1973), de Lima Barreto, quanto Lenita Perroy realizavam filmes de longa-metragem, respectivamente O segredo da rosa e Mestiça, a escrava indomável.

Vanja Orico, a quem rendemos uma homenagem especial nesta semana, nasceu em 1932. Por ser filha de um diplomata, morou em diversos países da Europa, expressando desde criança um enorme talento dramático. Em 1952, praticipou do filme Mulheres e Luzes de Frederico Fellini, cantando a música Meu limão, meu limoeiro. No Brasil, chamaria atenção no papel de Maria Bonita, cantando Sôdade e Muié rendeira. Além do filme citado acima, Vanja Orico foi argumentarista da produção Ele o Boto dirigido por Walter Lima Júnior, em 1986.

terça-feira, 22 de abril de 2008

Carlota

Bom, antes de continuarmos a nossa história sobre as rainhas de governaram o Brasil, esta semana, carlota Joaquina, vou atender a um pedido dos leitores que nos perguntaram sobre todas as rainhas de Portugal, antes de Carlota Joaquina, governar o nosso destino.

A primeira foi D. Luisa de Gusmão, que era espanhola e tornou-se rainha de Portugal pelo casamento com D. João IV em 1633. Depois da morte do rei assumiu a regência do reino durante cinco anos, durante os quais teve de enfrentar a oposição do Conde de Castelo Melhor, que pretendia que o futuro rei D. Afonso VI, invocasse o seu direito ao trono, fato esse que ocorreu em 1662, apesar da pouca apetência do futuro monarca para o cargo. Em 1663 afastou-se e foi viver para o Convento das Carmelitas Descalças, em Xabregas.

D. Maria Francisca de Sabóia, era portuguesa e reinou como rainha por ser esposa de D. Afonso VI, com quem casou-se em 1666. Como em toda a corte, Dona Francisca era uma mulher muito auspiciosa e no momento oportuno, contribuiu para o afastamento do próprio marido, D. Afonso VI, do trono, a anulação do casamento pelo Papa, podendo novamente se casar, em 1668, com D. Pedro II (com o qual mantinha já um relacionamento), que tomou conta do governo, primeiro como regente e, depois, jurado nas cortes de Lisboa, nesse mesmo ano. D. Maria Francisca teve, do seu casamento com D. Pedro, uma única filha, D. Isabel.

D. Maria Sofia de Neuburgo, foi a segunda mulher de D. Pedro II. Era filha de Filipe Guilherme, duque de Neuburgo e eleitor palatino do Reno. Casou com D. Pedro em 1687. Foi mãe de sete filhos, entre os quais D. João V.

D. Maria Ana de Áustria, mulher de D. João V, era Arquiduquesa de Áustria, filha do imperador Leopoldo I e da imperatriz D. Leonor Madalena. Em 1708 casou por procuração em Viena de Áustria com D. João V. Foi regente de Portugal em 1716 e novamente entre 1749 e 1750, nos últimos anos de vida de D. João V. Teve seis filhos, entre os quais a infanta D. Maria Bárbara (que viria a casar com D. Fernando de Espanha), D. Pedro (que casaria com D. Maria I) e D. José (que seria rei de Portugal).

D. Maria I, conhecemos a história no artigo anterior.

Vamos então a vida da famosa Carlota Joaquina, Princesa do Brasil e depois, Rainha de Portugal. Filha dos reis de Espanha Carlos IV e Maria Luísa de Parma, nasceu na Espanha em 22 de abril de 1775. Quando completou 10 anos de idade casou-se por procuração, com D. João VI. Quando viu o marido pela primeira vez, intuiu que o seu casamento seria um fracasso, tinha achado-o horrendo. Por isto, na noite nupcial, mordeu a orelha do marido e sacudiu-lhe um castiçal no rosto. A vida sexual do casal seria sempre uma tragédia, apesar disto, ficariam casados por 36 anos casados. Tiveram nove filhos, mas como dizem as más línguas, cinco deles não descendiam de D. João. Carlota Joaquim de Bourbon era uma mulher muito feia. D. Leopoldina (que casou com D. Pedro I), quando a viu pela primeira vez, achou-a tão feia que "baixou os olhos como não querendo voltar a vê-la; as marcas da varíola, o corte de cabelo, cordões e mais cordões de pérolas e pedras preciosas enroladas em seus cabelos, pendendo de seus cachos gordurosos como cobras".
Mas, como todo mundo sabe, sua feiúra era proporcional a sua alma ardente, ambiciosa, inquieta, sulcada de paixões e sem escrúpulos. Seus gritos de raiva, quando os prometidos jovens negros não eram trazidos a sua cama, conforme prometido, eram ouvidos em toda a cidade. Suas filhas não gostavam dela, como pode ser comprovado neste depoimento de D. Maria Tereza - “Ela é uma Bourbon e teve de casar com um Bragança, que não é uma estirpe boa. Com os portugueses tudo é indefinido... pouca ambição, pouco espírito de luta. Os nossos pais não nos amam, eles nos separaram; Pedro teve sorte de poder viver com o pai. Nós, as moças, as minhas duas irmãs e meu irmão Miguel tivemos de viver com ela... meu pai mandou prendê-la num convento, porque não podia mais confiar nela. Ela se oferece aos criados... No Convento da Ajuda tentaram conter o seu desejo com uma alimentação especialmente leve, mas voltou ainda mais briguenta, mas desajustada...”Dizem que Carlota era ninfomaníaca e que quando chegavam barcos do estrangeiro, ia pessoalmente ao porto escolher garotos para satisfaze-la.

Devido ao seu comportamento escrachado, Carlota Joaquina sempre foi vista pelos historiadores de maneira negativa. O fato é que ela era profundamente infeliz e ao contrário dos procedimentos reservados as mulheres da corte na época, reagiu com violência contra o seu destino.. Se estava mau humorada, mandava chicotear todos aqueles que não se ajoelhavam quando ela passava com seu cortejo.

Enfim, Carlota detestava o Brasil ‘país de negros e macacos’ e quando pode retornar a Portugal, ficou radiante. No dia 25 de abril de 1821, Carlota Joaquina, seu marido D. João VI, seu filho Miguel, seis princesas e 4.000 cortesãos, levando mais de 50 milhões de cruzados roubados às escondidas do Banco do Brasil, valor que correspondia a grande parte do Tesouro Real brasileiro, embarcaram de volta à Europa. Seu desprezo por estas terras era tanto que ao embarcam no navio, Carlota tirou os sapatos e disse: "Nem nos calçados quero como lembrança a terra do maldito Brasil".

De volta à Corte, continuou seus planos de dominar Portugal, através do filho D. Miguel. Morreu em 1830, no Palácio de Queluz.

segunda-feira, 21 de abril de 2008

Carmen da Silva

A arte de ser mulher, foi o título da primeira coluna da jornalista Carmen da Silva, na Revista Cláudia, de 1963. Os tempos eram libertários, mas a imprensa feminina brasileira não, até surgir esta morena gaúcha, que pregava a liberdade das mulheres, influenciando todo o pensamento da segunda onda do feminismo no Brasil.

Nascida no Rio Grande do Sul no dia 31 de dezembro de 1919, só começa a exercer o jornalismo na década de 40, quando viveu no Uruguai e na Argentina. Pouco se sabe deste período, onde chegou a publicar um livro.
Sua vida se transforma quando se muda para o Rio de Janeiro, no início da década de 60, quando consolidou-se como jornalista voltada para revistas e colunas femininas, que contribuiriam para a formação do pensamento de gerações de mulheres brasileiras.

Em sua autobiografia, Histórias híbridas de uma senhora de respeito, lançada em 1984, Carmem da Silva atribuiu a grande receptividade do seu trabalho ao fato de que transmitia em seus colunas a sua experiência como jornmalista e mulher, as dificuldade amorosas e financeiras, sempre com muito bom humor e delicadeza.
Todavia, no começo suas palavras assustavam. A franqueza com que expunha suas idéias e narrava os fracassos e conquistas, gerando uma espécie de jornalismo feminino que faz muito sucesso hoje, foi conquistado por Carmem da Silva. Segundo ela “meus artigos caíram como UFOs incandescentes no marasmo em que dormitava a mulher brasileira naquela época. Logo comecei a receber uma avalancha de cartas de todos os tons: desesperados apelos. xingamentos, pedidos de clemência: deixem-nos em paz, preferimos não saber! consciência dói...”.

Com o tempo, o vínculo entre a jornalista e as leitoras foi se tornando cada vez mais forte. Encorajada por uma correspondência cada vez mais íntima, publicava os desafios e confidências que recebia com pseudônimo nos jornais, expressando junto a estas cartas seus medos e ambivalências. Com a coluna A arte de ser mulher, conquistaria o sucesso definitivo. Ali defendia que a mulher deveria tornar-se um ser humano total e participante. Desmistificava a rainha do lar, mostrando a limitação dos horizontes da mulher, de quem a sociedade não exigia mais do que as habilidades necessárias às tarefas domésticas. Para ela, a mulher tradicional, a dona de casa, deveria abrir as janelas para o mundo, tornar-se uma pessoa ativa em seu meio social e, principalmente, construir a vida a partir do eu-real, sem ilusões ou miragens, conquistando opiniões e valores próprios baseados na experiência da vida. O mais interessante em seu pensamento era a defesa permanente de uma relação companheira entre homem-mulher e, a necessidade de respeito entre pais e filhos, pela superação de preconceitos e tabus.

O termo feminismo só entraria nos seus artigos na década de 70, pois como ela mesma dizia, era ainda um bicho-papão e poderia afasta-la da imprensa. A partir daí dedicaria boa parte de seus artigos ao tema, participaria ativamente nas principais manifestações públicas em defesa dos direitos da mulher. Na inesquecível passeata organizada pelo movimento feminista no centro do Rio de Janeiro em 1985, estava na frente de todas as mulheres, vestida de liberdade.

Sua morte foi totalmente inesperada. Estava dando uma palestra em Volta Redonda quando a sua barriga começou a inchar. Brincando com o público dizia ter ficado grávida de um momento para o outro, na verdade era um aneurisma abdominal, que a matou estupidamente horas depois, no dia 29 de abril de 1985.

domingo, 20 de abril de 2008

Carmen Miranda

CARMEN MIRANDA

O busto de Carmen Miranda, trajando uma fantasia de baiana, envolta por colares e com um turbante tutti-fruti, foi inaugurado em 20 de setembro de 1960, no Largo da Carioca. A iniciativa foi da loja de discos e música chamada o Rei da Voz, de propriedade de Abraão Medina. Em entrevista telefônica realizada com o Sr. Abraão Medina, fui esclarecida que o local fora escolhido por haver ali um ponto de bonde que, por causa do seu formato, era conhecido como tabuleiro da baiana. Foi interpretando uma canção de Dorival Caymmi com este título e outras marchinhas de carnaval que Carmen Miranda conquistou o coração dos brasileiros.
Dentre todas as mulheres de bronze, Carmen Miranda foi a mais conhecida e ainda hoje é cultuada. Não é por acaso que o seu busto foi colocado no meio do burburinho da cidade.
A dimensão popular de Carmen Miranda é indiscutível, mas nem por isto ela deixou de ser criticada com rigor durante a sua vida e depois de sua morte. Trazida para o Brasil com apenas um ano de idade, pois nasceu em Portugal no dia 9 de fevereiro de 1909, Carmen pertencia a uma família de poucos recursos, o que a levou a trabalhar como chapeleira aos quinze anos de idade. Costumava nesta época cantar com as irmãs na pensão em que vivia com a mãe, freqüentada por muitos músicos. Um deles , Josué de Barros convidou-a para participar de uma festa beneficente no Instituto Nacional de Música. Após esta apresentação foi convidada para se apresentar na Rádio Sociedade, onde cantava sempre as composições de Josué de Barros. O primeiro sucesso veio com Taí, música feita por Joubert de Carvalho só para ela. A partir daí, cantava sempre sambas inéditos de vários compositores, entre eles Ary Barroso, Assis Valente e Dorival Caymmi, este revelado pela cantora. Esta primeira fase da sua vida foi posteriormente considerada a melhor. Vejamos porquê.

Na década de 40, Carmen Miranda é convidada pelos estúdios de Hollywood para filmar musicais. Nesta época, a cantora cria a visualidade tropical e exótica que marcará sua imagem até os dias de hoje. Transformada concomitantemente pelo cinema americano num fenômeno de massas e na primeira divulgadora internacional da cultura brasileira, Carmen Miranda era o Brasil das bananas e balangandãs. Na sua época, era inconcebível que uma mulher chamasse atenção travestida numa fantasia tropicaliente, com trejeitos exagerados, e que ainda por cima fosse considerada a porta-voz do país.
As críticas iriam desde a sua maneira de se comportar americanizada, o que levaria o público a recebê-la com frieza numa apresentação no Cassino da Urca em 1945, até ao fato de que com todo o exagero visual ela não podia mais cantar bem. Sabendo da recepção a Carmen nesta apresentação, Luiz Peixoto grande compositor carioca, fez Disseram que eu voltei americanizada, ridicularizando a crítica musical carioca. Mais tarde, a Bossa Nova diria que Carmen Miranda não teria voltado americanizada o suficiente, não tendo podido desencadear as transformações que a Bossa Nova iriam realizar.

Apesar do sucesso, a morte precoce de Carmen Miranda no dia cinco de agosto de 1955, não deu tempo para que ela fosse tratada, merecidamente, como referência essencial para a cultura musical brasileira. Sua glória era a glória conferida pelo povo e não pela crítica. O busto instalado no coração absoluto da cidade é uma das evidências deste fato.

Com a reforma do Largo da Carioca, na década de setenta, o busto foi transferido para o depósito da Fundação Parques e Jardins e posteriormente colocado na Rua Carmen Miranda, na Ilha do Governador. Apesar de ir morar em um bairro tão longe, o busto de Carmem Miranda ainda é uma referência. Em entrevista no programa Jô Soares, o travesti Isabellita dos Patins afirmou que o monumento principal de sua vida era o busto de Carmen Miranda na Ilha do Governador. Ele via no busto a perfeita representação de uma mulher que foi o primeiro travesti, reconhecida, amada, adorada, uma mulher que atravessou todos os tempos.

sábado, 19 de abril de 2008

Carmem Santos

Lembrando as nossas leitoras que janeiro a coluna história feminina irá falar das cineastas, começando por Cleo de Verbena, a primeira a dirigir uma película no Brasil, vamos dar continuidade com a vida de uma artista muito interessante: Carmen Santos, que além de ser uma atriz muito bonita, teve uma aparição interessante na cinematografia brasileira.

Maria do Carmo Santos Gonçalves nasceu em Vila da Flor, Portugal, em 1904 e mudou-se para o Rio de Janeiro em 1912, naturalizando-se brasileira. Segunda mulher a dirigir um filme no Brasil, Carmem Santos estreou no cinema aos 15 anos como atriz de Urutau (1919), filme comercialmente inédito de William Jansen. O tema do filme já era interessante e inovador. Falava de uma moça humilde que morava no sertão e que por ser muito feia não conseguia arranjar um namorado. O tempo passava, suas amigas se casaram e ela continuava desprezada.

Mantendo ainda alguma esperança de que lhe surgisse um pretendente - pois, afinal, tinha suas qualidades: inteligente, trabalhadeira e boa cozinheira - adquiriu o hábito de sair à noite para passear pelos campos e bosques.Certa vez, em um desses passeios, ouviu que um cavalo se aproximava. Com coração aos pulsos, imaginou que ali vinha o homem que se casaria com ela. Em poucos segundos viu descer de um cavalo, um belo e garboso cavaleiro, um príncipe que se aproximou e perguntou-lhe como podia chegar à estrada principal. A moça habilmente procurou cativar o príncipe pela gentileza e ofereceu-se para acompanhá-lo. Apesar de feia, era muito inteligente e foi fácil manter uma conversa agradável com o príncipe que, impressionado e não lhe percebendo a feiúra, pois não havia luar, pediu-a em casamento. Mas infelizmente, sua felicidade durou pouco. A lua surgiu, iluminando o rosto da jovem. O príncipe, tomado de grande espanto, inventou uma desculpa para se afastar e se foi. A jovem, que de nada suspeitava, ficou esperando o seu regresso.Muito tempo depois, uma feiticeira sua conhecida, ia passando e parou para conversar. A moça contou a ela o que acontecera e pediu para ser transformada numa ave e, assim, poder encontrar logo o príncipe. A feiticeira não queria, mas a jovem insistiu tanto que ela acabou concordando. Partiu, então, a jovem, transformada numa ave feia e desajeitada. Percorreu toda a região por várias vezes e nada de avistar o príncipe, que àquela altura, já estava bem longe.Desolada, a ave - que era o urutau - procurou a bruxa e pediu para voltar à forma humana. Esta, porém nada pode fazer e a pobre teve que se conformar com seu destino de ave feia e triste. É por isso que, quando a lua aparece, o urutau solta aquele grito triste que parece dizer "foi, foi, foi", lembrando o príncipe que fugira da moça feia.

Bom voltando a nossa história, com o filme a atriz fez o maior sucesso e passou a ser a estrela defilmes mudos, como A carne, Mademoiselle Cinema, Lábios sem beijos e Sangue Mineiro , este último uma maravilha do primeiro grande cineasta Brasileiro, Humberto Mauro. Os temas tratavam mais uma vez do feminino, mas em Sangue Mineiro a mocinha sairia vitoriosa. Carmem Santos, fazia a filha adotiva de um milionário mineiro, que sofre uma desilusão amorosa ao ver seu namorado beijando sua irmã. Tenta o suicídio jogando-se num lago, mas, é salva por dois jovens que a recolhem a uma fazenda. Os dois rapazes apaixonam-se por ela. Sua família a procura e após um encontro com sua irmã e seu ex-namorado, Carmen os perdoa. Aceita, então, o pedido de casamento de um dos jovens, enquanto o outro mantém seu amor em segredo.

Em 1933 participou da fundação da companhia Brasil Fox filmes, quando realizou o seu primeiro filme Onde a terra acaba. O filme, dirigido por Mário Peixoto, acabou não estreando, pois a atriz vivia em uma profunda crise existencialOnde a terra acaba". É interessante observar que ano passado Sergio Machado fez um documentário sobre a vida e da obra de Mário Peixoto, que mostra os 300 metros de fita que restaram das primeiras gravações do que seria o segundo filme de Mário Peixoto, além do making of de "Limite" e imagens do arquivo pessoal e depoimentos do cineasta, morto em 1998.

Em 1935 a empresa passou para a sua responsabilidade com o nome de Brasil Vita Filmes, para a qual construiu um estúdio e importou equipamentos, no bairro da Muda – Rio de Janeiro. A modernização do parque cinematográfico era uma das preocupações dos produtores brasileiros da década, marcada pelo sucesso dos filmes sonoros americanos.

Nesta época, Carmem Santos começou a dedicar-se ao projeto de filmar a história de Tiradentes começou a se esboçar juntamente com a instalação da companhia. Enquanto produzia e estrelava outros filmes, e após tentar a colaboração dos melhores diretores da época, como Humberto Mauro e Mário Peixoto, a produtora assumiu também a direção e o principal papel feminino do projeto, o de Bárbara Heliodora. A realização do filme, cercada de minuciosos cuidados com cenários e figurinos, foi pontuada por constantes interrupções, acarretando a substituição de técnicos e atores. Quando da sua estréia em 1948, Inconfidência Mineira foi recebido com descrédito e frieza pela crítica, tendo sido também boicotado pelos principais exibidores, antagonizados com a produtora. Esta seria a última realização de Carmem, que morreria de câncer em 1952.

sexta-feira, 18 de abril de 2008

Cecília

Em julho, mês friozinho que nos faz desejar ficar em casa e ler um bom livro, vamos falar das escritoras e poetisas brasileiras. A primeira delas, Cecília Meireles, cujo livro Viagem Vaga Música, que é uma leitura deliciosa e muitíssimo feminina, acaba de ser relançado em edição com preço popular de R$ 11.90, nas bancas de jornal. A poesia de Cecília é feita por uma mulher, e por isto traçada a partir de um sem número de perspectivas sobre as coisas que os homens jamais poderiam ter...como ela mesma diria em seu poema Noções - “Entre mim e mim, há vastidões bastantes/para a navegação dos meus desejos afligidos./Descem pela água minhas naves revestidas de espelhos./Cada lâmina arrisca um olhar, e investiga o elemento que a atinge. “

"Nasci no Rio de Janeiro, três meses depois da morte do meu pai, e perdi minha mãe antes dos três anos. Essas e outras mortes ocorridas na família acarretaram muitos contratempos materiais, mas ao mesmo tempo me deram, desde pequenina, uma tal intimidade com a morte que docemente aprendi essas relações entre o Efêmero e o Eterno. Em toda a vida, nunca me esforcei por ganhar nem me espantei por perder. A noção ou sentimento da transitoriedade de tudo é o fundamento da minha personalidade."

Cecília Meireles nasceu no Rio de Janeiro, em 7 de novembro de 1901, mesma cidade em que morreu, a 9 de novembro de 1964. Criada pela avó materna, Jacinta Garcia Benevides, viveu uma infância de silêncio e solidão, salva por sua paixão pelos livros, que formaria o seu caleidoscópio poético. Desta época, existem os versos e cantigas compostas para os seus brinquedos. Aos 16 anos, se diploma professora, estuda outros idiomas e ingressa no Conservatório Nacional de Música, onde tem aulas de canto e violino. Neste momento, Cecília começa a escrever poesias, mas somente aos 18 anos, ela publica o seu primeiro livro de poemas: Espectros. Três anos mais tarde, casa-se com o artista plástico português Fernando Correa Dias, que ilustraria suas futuras obras e seria pai de suas três Marias: Elvira, Matilde e Fernanda. Seus primeiros livros têm como tema o misticismo, o desejo da união da alma humana com Deus. A partir de 1925, a educadora Cecília Meireles se sobressai à poeta, publicando o livro Criança, meu amor, que posteriormente seria indicado como leitura oficial nas escolas. Dois anos depois, ela se candidata à cátedra de literatura da Escola Normal, mas o cargo destinava-se a alguém reconhecidamente católico, e ao apresentar um trabalho que falava sobre liberdade individual na sociedade, é desclassificada. Apesar disto, mantém a sua preocupação com a educação no país e, de junho de 1930 e janeiro de 33, cria e dirige uma coluna sobre educação no Diário de Notícias do Rio de Janeiro. No ano seguinte, inaugura o Centro de Cultura Infantil do Pavilhão do Mourisco, no Rio.

Em 1935, seu marido se suicida e a poetisa fica responsável pela educação das três filhas. Volta a lecionar; escreve sobre folclore no jornal A Manhã e crônicas para o Correio Paulista. Além disso, mantém sua atividade no Pavilhão Mourisco. A Biblioteca Infantil, é um sucesso no Rio de Janeiro até 37, quando é invadida e fechada por um interventor do Estado Novo, por divulgar o livro As Aventuras de Tom sawyer, de Mark Twain, um clássico norte-americano, considerado uma obra comunista.

O ano de 38, marcará seu retorno à poesia, com o livro Viagem, que recebe o Prêmio de Poesia da Academia Brasileira de Letras, fundamental para que Cecília se dedicasse totalmente à sua arte.

Em 1940, casa-se com Heitor Grillo e parte para o exterior, para ensinar literatura e Cultura Brasileira na Universidade do Texas e em diversos países da América do Sul e da Europa. Até o final dos anos 40, produz intensamente, criando obras onde transmite de maneira magistral à sua perplexidade diante do enigma da existência humana. O início da década de cinqüenta será de grande produtividade poética e de idéias inéditas como a pesquisa que fundamenta uma de suas obras mais conhecidas, o Romanceiro da Inconfidência, publicado em 1952, cuja narrativa rimada, com forte acento histórico e nacionalista, remete o leitor à Inconfidência Mineira. No mesmo ano em que o Romanceiro é publicado, Cecília Meireles recebe o título de Doutor Honoris causa da Universidade de Déli, na Índia. Ela havia sido convidada pelo governo indiano a participar de um simpósio sobre a obra de Gandhi. O trabalho lhe rendeu o título concedido. Até a sua morte vivia em plena atividade literária, deixando incompleto um poema épico-lírico, escrito em comemoração ao quarto centenário do Rio de Janeiro, sua cidade Natal. Além deste poema, deixa inúmeros textos inéditos. No ano seguinte à sua morte, a Academia Brasileira de Letras concede-lhe o Prêmio Machado de Assis, pelo conjunto da obra. Amada pelo público - até hoje, Cecília Meireles é a poeta mais lida do Brasil. Musical, lírica, delicada, sentimental e rigorosa, esta maravilhosa escritora cumpriu a mais desejada de suas metas : "acordar a criatura humana dessa espécie de sonambulismo em que tantos se deixam arrastar. Mostrar-lhes a vida em profundidade. Sem pretensão filosófica ou de salvação - mas por uma contemplação poética afetuosa e participante."

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Chica

Encerrando o mês e setembro, que dedicamos às mulheres que por simbolizaram a nossa terra, vamos falar de uma negra esfuziante, que nascida escrava brilhou no Brasil Colônia, tornando famosa uma das mais bonitas cidades do Brasil – Diamantina. Chica da Silva exerceu tal influência em sua época, que comprou a sua alforria, possuiu a casa mais bonita de sua cidade e mais de 100 escravos, além de ajudar a subvencionar, a Inconfidência Mineira.

Filha de uma negra, Maria da Costa, e um branco, Antônio Caetano de Sá, a escrava Chica da Silva nasceu pertencendo a Manoel Pires Sardinha, com quem teve eu primeiro filho, Simão, em 1751. Juiz e Presidente do Senado da Vila do Príncipe, Sardinha estava impedido de assumir a paternidade do filho, mas concedeu-lhe alforria quando o menino foi batizado.

Francisca Parda, como era conhecida, foi libertada a pedido do Desembargador João Fernandes de Oliveira, que chegara ao arraial do Tejuco em 1753 para exercer o cargo de contratador que o pai, que tinha o mesmo nome, conquistara junto à Coroa treze anos antes. A região era a mais cobiçada da colônia portuguesa, pois ali, desde 1729, foram descobertas as minas de diamantes. O contratador era o homem que cobrava os tributos relativos a exploração desta pedra preciosa e era a única pessoa autorizada a exporta-la.

Em 1754, Chica foi viver com este homem poderoso. No ano seguinte já tinha um sobrado e de maneira muito própria, foi inserindo-se na vida livre da cidade, incorporando os costumes portugueses, comprando bens de maneira a se sentir respeitada e intervindo na cultura local, como por exemplo, mandando construir ao lado de sua casa uma igreja e um teatro, onde recebia os seus convidados. Durante o seu casamento, que durou quinze anos, teve 13 filhos, nove mulheres e quatro homens.

A média de um filho a cada treze meses nos faz crer que sua fama de mulher extremamente sedutora, lasciva e devoradora de homens não seja bem verdadeira. João Fernandes, por sua vez, reconheceu todos eles, legou-lhes o seu patrimônio. Apesar de não poder se casar com Chica da Silva, pois era proibido o casamento entre o homem branco e a mulher negra, fez de tudo para que vivessem uma vida familiar autêntica, honrando seus filhos e sua mulher. Chica tinha todos seus desejos atendidos pelo amante. Como não conhecia o mar, João Fernandes mandou construir em sua chácara, que não era a sua resdência, no bairro da Palha, um barco com capacidade para dez pessoas. O navio, com mastros e velas, navegava no lago da chácara junto com uma orquestra particular que embalava as recepções.

Chica tinha a conduta de uma mulher de elite. Educou suas filhas na melhor escola da cidade e as preparou para um bom casamento. Embora tivesse ganho prestígio a partir de sua relação com o contratador, foi uma espécie de mecenas, protetora das artes locais, incentivando desde pintores, para quem mandou construir uma escola destinada a ensinar a pintura religiosa, até os homens letrados, financiando pequenas publicações.

Gastava seu dinheiro também com os homens pobres, principalmente os seus escravos, financiando casamentos, batismos e enterros. Todavia, não os libertava e mantinha-os sob o julgo do seu poder.

Em 1770, João Fernandes foi obrigado a voltar para Portugal para prestar contas de sua atuação como contratador e rever o testamento deixado pelo pai, determinando o afastamento definitivo entre os dois. A preocupação de Chica então voltou-se exclusivamente para o futuro das filhas. Passou a fazer das principais irmandades religiosas da cidade, como a de São Francisco, Carmo (exclusiva de brancos), Mercês (de mulatos) e Rosário (negros).

A imagem de Chica da Silva que se tornou popular foi a de uma mulher imoral, que se utilizava de sua beleza para conseguir o que queria. No entanto, este é um estereotipo, pois como já dissemos antes, não seria possível manter uma aparência sedutora com tantas maternidades. A primeira vez que Francisca da Silva apareceu como uma personalidade histórica, foi nos textos de Diamantina publicados pelo historiador Joaquim Felício dos Santos. Segundo ele, que chegou a recolher depoimentos de pessoas que conviveram com Chica, ela não correspondia nem um pouco a esta imagem: "(...) não possuía graça, não possuía beleza, não possuía espírito, não tivera educação, enfim não possuía atrativo algum que pudesse justificar uma forte paixão", diz. Já Nazaré de Menezes diz o contrário: "poderia ser grosseira, mas nunca odienta e asquerosa (...) não fosse não teria inspirado paixão tão ardente e duradoura".

Bonita ou não, o fato é que Chica da Silva, venceu soberanamente uma sociedade preconceituosa, como poucas mulheres de sua época conseguiram fazer em todo o mundo. Morreu em 1796 e foi enterrada na igreja de S. Francisco de Assis, privilégio reservado apenas aos brancos ricos da região.

quarta-feira, 16 de abril de 2008

Chiquinha

Ó abres alas!
Que eu quero passar
Eu sou da lira
Não posso negar....

A vida da Maestrina Francisca Gonzaga já foi contada e cantada de diversas maneiras. A importância desta compositora foi reconhecida já em vida e hoje Chiquinha Gonzaga e suas músicas são consideradas um passado vivo e fundamental para a Música Brasileira.

Nascida na cidade do Rio de Janeiro, em 17 de outubro de 1847, filha de um oficial do exército com uma mestiça, Francisca Edwiges Gonzaga, foi educada em casa por um cônego. Além da alfabetização e leitura, do cálculo e do catecismo, o professor ensinou a Chiquinha alguns idiomas estrangeiros.

Como complemento a formação social, José Basileu ,seu pai, contratou um maestro de piano para dar aulas a filha. O que deveria ser apenas uma prenda doméstica, o estudo do piano transformou-se para Chiquinha Gonzaga no motivo de sua vida. Tanto que no casamento em 1863, aos 16 anos, com Jacinto Ribeiro do Amaral, o piano foi o dote e o principal responsável pela separação do casal. Mesmo com dois filhos, Chiquinha preferia dedicar-se ao piano, do que aos afazeres do casamento.

Tentando separar a mulher do instrumento, Jacinto obriga Chiquinha a fazer uma viagem com ele para o Paraguai, pois sua família era dona dos navios alugados ao governo brasileiro durante a guerra. Separada do piano, Chiquinha foi juntar-se aos negros escravos nos porões do navio, onde aprendia as melodias e ritmos africanos. O marido, não suportando mais esta situação pede a mulher que opte entre ele e a música, ao que ela responde: Sinto muito, mas não posso viver sem harmonia !

Renegada pelos pais, Chiquinha se estabelece na cidade como professora de piano. Joaquim Callado, criador do gênero musical conhecido como choro, adotou-a logo após a sua expulsão e ela passou então a freqüentar o universo boêmio da cidade. Em 1869 Callado dedicou-lhe uma polca, a primeira composição do músico editada, intitulada Querida por Todos, que segundo Edinha Diniz , sua principal biógrafa.

"Mais que uma recepção calorosa, ou até mesmo carinhosa, como o título sugere, Querida por Todos representou um salvo conduto para a introdução de Chiquinha no meio musical. O apadrinhamento declarado assim por Callado, músico respeitado, abria as portas daquele ambiente para a jovem novata e pianista.".

Embora cortejada pelo músico, Chiquinha se entregou a uma paixão pelo jovem João Baptista de Carvalho, rico engenheiro , freqüentador da casa dos Gonzaga, e passou a viver com ele. Apaixonado pela vida e pelas mulheres, João Baptista será o grande amor da vida de Chiquinha, mas o mais sofrido também. Concorria para a desgraça da relação, a queda do rapaz pelas mulheres e a forte repressão da sociedade em relação ao concubinato. Sair do Rio era aparentemente a única maneira de resolver estes problemas, e por duas vezes o casal foi morar na fronteira com Minas Gerais. Mesmo afastado da vida boêmia, João Baptista mantinha seus casos com mulheres, o que em 1876 levou Chiquinha abandoná-lo e a filha Alice Maria, de apenas meses de idade. Mais uma vez, fugia do casamento com o filho mais velho, e deixava para trás outro bebê. O destino de Alice Maria não foi diferente do de seus irmãos, foi criada por um parente da família de João Baptista.

Ao retornar para o Rio, Chiquinha Gonzaga se reaproxima de Callado e passa a ser pianeira do seu grupo de música, chamado Choro Carioca. O pianeiro, era um pianista que sem possuir o estudo completo do instrumento, acabava por improvisar na música. O choro era principalmente tocado nas festas domésticas, como os batizados, onde não faltavam boa comida e bebida.

Foi numa destas festas de choro, que Chiquinha apresentou ao grupo de cavaquinhos e violões sua primeira melodia, que por ter sido rapidamente aceita e assobiada por todos, foi intitulada "Atraente". Quando esta música foi editada Chiquinha tinha 29 anos de idade. Era jovem, bela e livre. Seus contemporâneos registraram alguns dos seus atributos femininos: sedutora, formosa, insinuante, sensual, faceira. Chegaram a defini-la como uma cabocla estonteante.

O sucesso trazia consigo uma reação negativa da sociedade. Curiosamente, as quadrinhas e paródias maliciosas faziam uma analogia entre o título da polca e a compositora, e nesta época uma mulher não podia ser atraente, nem tão pouco conviver diretamente com a boemia. A hostilidade em relação a Chiquinha era muitas vezes estimulada pela própria família. Freqüentemente, o moleque contratado por ela para vender suas partituras nas ruas, era molestado por pessoas que se diziam amigos dos Gonzaga, que rasgavam todas as partituras carregadas por ele, dando enormes prejuízos à compositora. O fato é que Chiquinha não se intimidou, produzindo e editando partituras incessantemente.

Foi com o teatro de revista que Chiquinha conquistou um lugar definitivo na música popular. O teatro de revista foi um fenômeno importante na educação musical das camadas mais pobres. Nele eram narrados de maneira cômica os acontecimentos do ano. E foi musicando em 1885 o libreto chamado "A Corte na Roça ", que Chiquinha Gonzaga estreou como Maestrina. É preciso dizer que a idéia de uma mulher musicar uma peça, uma atividade até então restrita aos homens criou embaraços na época. Por outro lado, título de Maestrina era uma compensação para os sofrimentos que a opção pela música lhe dera.

Chiquinha não parou por aí: foi ainda ela que promoveu o grande encontro entre o carnaval e a música urbana. Antes da sua composição o Abre-alas, não havia canções carnavalescas cantadas na rua. Este samba inventou os queridos blocos de carnaval do Rio.

Os últimos anos de sua vida ainda lhe trariam surpresas, e por meio da mulher do Presidente Hermes da Fonseca, a música de Chiquinha Gonzaga seria tocada no Palácio do Catete. Nair de Teffé, ouvira de seu amigo Catulo da Paixão Cearense que a música nacional não habitava o palácio de governo. Sensibilizada com o fato, incluiu na programação da noite do dia 26 de dezembro de 1914 o Corta Jaca, que ritmicamente era considerada uma das mais audaciosas composições de Chiquinha Gonzaga.

No dia seguinte, os jornais imprimiam matérias relatando o espantoso evento. Muitos deles foram negativos ao fato de a música popular invadir o Palácio.

Maestrina consagrada, Chiquinha irá viver os anos seguintes de sua vida, musicando, criando novas peças e apoiando com o seu prestígio a publicação das músicas de novos compositores, como foi o caso de Luiz Peixoto (1889-1973). Aos 87 morre em sua casa na Praça Tiradentes, em plena terça-feira de carnaval, 28 de fevereiro de 1935.

terça-feira, 15 de abril de 2008

Clara Camarão e as índias Isabel

Clara Camarão

Índia brasileira nascida no início do século dezessete, possivelmente da nação dos Potiguar foi catequizada por padres jesuítas, na aldeia de Igapó. Casou-se com o chefe da tribo Poti, catequizado como Felipe e junto a ele adotou o sobrenome Camarão – tradução exata do nome Poty. Ao lado do marido combateu contra os holandeses em Pernambuco, liderando um grupo de guerreiras. "Armada de espada e broquel , montada a cavalo, foi vista nos conflitos mais arriscados (...) com admiração dos holandeses e aplausos dos nossos", diz Domingos Lorete.

Este grupo de mulheres ficou conhecido como as Heroínas de Tejecupapo, pequena aldeia da zona da mata pernambucana, que foi palco de uma das batalhas ocorridas contra a dominação holandesa. Conta a História que os holandeses se encontravam sitiados em Olinda, sem ter o que comer e obrigados a avançar para o litoral. A primeira aldeia era Tejecupapo, onde viviam no máximo duzentas pessoas. Buscando deter os estrangeiros, todos os homens da aldeia fizeram uma barricada na estrada e por serem em número muito inferior, foram totalmente liquidados. Ao chegar na aldeia, eis que os holandeses encontram um grupo organizado de mulheres guerreiras lideradas por Clara Camarão e pasmem, são por elas derrotados.

Pela primeira vez, uma mulher, e ainda por cima índia, era considerada heroína no Brasil. Por seus feitos corajosos, foi-lhe dado o direito de ser chamada de Dona e de receber o hábito de Cristo, junto com seu marido, concedido pelo rei Felipe IV.

AS ÍNDIAS ISABEL

Isabel, que segundo narram os contadores, era uma índia baiana que foi vítima da crueldade do seu Senhor, o proprietário de engenho de açúcar, Fernão de Tavares Cabral de Taide. Acusada pelo patrão e por sua senhora, Dona Margarida, de comentar os casos amorosos do casal, foi queimada viva, na frente de todos na vila, causando horror a sociedade baiana da época. O feitor ameaçava a qualquer um que intervisse de joga-lo na fornalha. Como Deus é justo, o mesmo Senhor foi denunciado à Inquisição, dentre outras coisas pela morte da escrava e teve um final trágico, o mesmo de sua vítima.

Isabel , vivia em São Paulo no século XVII e foi uma das primeiras índias alforriadas no Brasil, por isto seu nome ficou famoso. Seu Senhor, a pedido da mãe, a libertou da escravidão desde que servisse eternamente a família, grandes coisas né?

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Clarisse

Histórias de Mulheres

As mulheres brasileiras conhecem muito pouco de sua história e com isto perdem a oportunidade de perceber que na conquista da autonomia do ser feminino, muitas mulheres ousaram ser originais e criativas diante dos obstáculos de sua época.
Perceber a importância destas vidas femininas, é uma maneira de estimular na nossa imaginação e a criatividade na arte de estar viva e presente neste mundo.

Em Janeiro conheceremos as Mulheres de Bronze, mulheres que tiveram uma existência real, e que forma um conjunto composto por dez obras de arte, 7 bustos e três estátuas, que revelam através de sua impassível existência monumental, o sentido da vida de cada uma destas mulheres.

As Mulheres de Bronze compõem uma poética que articula a memória ao feminino, na medida mesma em que se entrelaça à história do tecido urbano. Ao serem colocadas no espaço público elas se tornaram seres exemplares e cada vida bronzificada é uma virtude, um espírito fundador de uma ordem pública. Ana Amélia - praça Ana Amélia no Castelo, onde foi construída sob sua direção a Casa do Estudante do Brasil. Ana Nery - praça Ana Nery, em frente ao Hospital da Cruz Vermelha, na Lapa, que a tomou como símbolo em suas campanhas assistenciais. Carmen Gomes e Vera Janacopoulos, cantoras líricas que se encontram na Praça Paris, cujo traçado é tributo à cultura erudita européia. Julia Lopes de Almeida e Chiquinha Gonzaga reinantes no Passeio Público, primeiro espaço no Rio de Janeiro, destinado aos vultos artísticos.

Clarisse Índio do Brasil, primeiramente nos jardins da Glória e depois no Largo dos Leões, no bairro onde vivia a aristocracia carioca da belle époque, da qual foi uma estrela. Carmen Miranda, inicialmente no Largo da Carioca num local chamado o Tabuleiro da baiana, porque havia ali um terminal de bonde cuja forma lembrava o tabuleiro imortalizado numa canção interpretada pela cantora. Mas tarde o busto foi removido para engraçar a rua com o nome Carmen Miranda na Ilha do Governador. Imperatriz Leopoldina – Quinta da Boa Vista, em frente ao palácio onde morou com a sua família e incentivou a cultura imperial e Zuzu Angel em São Conrado, onde perdeu a vida em um acidente de caráter duvidoso, representada de maneira mais abstrata, confirmando esteticamente sua vocação para o mundo contemporâneo.

Ao contrário daquelas estátuas de deusas gregas, ou das virtudes públicas: fidelidade, verdade, amor, etc, que desde a antiguidade decoravam a polis, que atribuem de maneira alegórica papéis socais nem sempre fáceis de cumprir para as mulheres; as mulheres de bronze tiveram um existência real e são retratos que nos conduzem à temporalidade da vida e da morte. Revelam o reconhecimento dessas mulheres como indivíduos, com valor e realidade próprios. Este reconhecimento só foi verdadeiramente possível no século XX. Se considerarmos todas as grandes cidades do mundo, veremos que as estátuas de mulheres são em número infinitamente menor do que as dos homens.

Destinadas ao tempo eterno, elas estarão para sempre observando o nosso passear pela cidade, dando solidez às transformações urbanas, habitando na diferença do tempo passado. No próximo artigo, conheceremos a primeira mulher de bronze do Rio de Janeiro, Clarisse Índio do Brasil, personalidade que fala de sua época e de uma certa busca de emancipação, mais feminina e familiar, uma memória um pouco desvalorizada nos dias de hoje.

Clarisse Índio do Brasil

Nasceu em 4 de abril de 1864, no Rio de Janeiro, filha de Ana Rita de Matos Costa Pereira de Faro e do Comendador Antônio Martins Lage. Em 1833, casou-se com Artur Índio do Brasil a contragosto da família e abdicando do seu dote, pois ele era um homem mestiço que não possuía um sobrenome reconhecido, o seu havia sido criado por ele mesmo. Segundo sua neta, Clarisse de Oliveira, os dois se apaixonaram verdadeiramente e viveram o seu romance como os personagens Ceci e Peri, do romance O Guarani de José de Alencar. Só que no caso deles, conseguiram morar juntos e viraram uma referência cultural do Rio de Janeiro da Belle Époque. Por este ato de liberdade, Clarisse Índio do Brasil conquistou a possibilidade de ser uma mulher diferente, que tinha bichos exóticos em casa e desfilava pela rua com o seu Macaco Nero, vestido com roupas imperiais. Na sua casa aconteciam festas muito badaladas, com a presença dos principais artistas da época, como era um costume da época. Ao invés do bar, espaço tipicamente masculino, as mulheres preparavam ceias regadas a poesia e canto, onde podiam discutir livremente os seus pensamentos.

A monumentalização de Clarisse Índio do Brasil se deve a um fato muito especial: o tiro a queima-roupa que recebeu na Av.Rio Branco no dia 6 de outubro de 1919, que levou-a à morte na tarde do dia seguinte. Foi nessa tarde, que diante do pedido de misericórdia da esposa do assassino, Clarisse sussurrou ao marido: "Perdoa, Coração!". O seu assassinato foi cometido sem nenhum motivo aparente. Seguindo sua rotina, no dia seis de outubro de 1919, foi de limusine buscar o marido no trabalho e enquanto esperava-o, na esquina da avenida Rio Branco com Ouvidor, levou um tiro no peito. Segundo sua neta, o chofer acreditou ser um pneu do carro estourando e quando foi abrir a porta para a senhora sair, a viu com a mão no peito a apontar um desconhecido na multidão. O assassino, Mário Coelho, era taquígrafo do Senado e em uma declaração pública fez o papel de vítima: "Sou um tarado. As circunstâncias da vida de mim fizeram um tarado degenerado”.

Clarisse era vista como uma figura "de inigualável sobranceria, ressaltava na turba com a aristocrática beleza de uma fidalga dama de outras eras. Tinha a formosura, a graça, a inteligência, a fortuna e possuía, acima de tudo, esse raro condão de simpatia que é o supremo apanágio das grandes almas: a bondade." Era também famosa por suas doações as instituições de caridade, principalmente de Botafogo, bairro em que morava. No busto, onde estava inscrito em letras de bronze - "A Clarisse Indio do Brazil, os pobres de Botafogo - 1923"; esta imagem foi cristalizada.

À imagem pública de caridade se deveu a sua capacidade de perdoar. Foi o perdão, como única possibilidade de remediar a irreversibilidade do ato que poria fim a sua vida, que marcou definitivamente a mulher Clarisse Indio do Brasil no Rio de Janeiro na época. Falo da cidade como um todo, porque a expressão "Perdôa Coração!" foi elogiada em verso e prosa, não somente por alguns dos mais famosos homens de literatura, como por pessoas comuns que não a conheciam.

Em cada um destes testemunhos, a fatalidade parece ter sido o caminho para a eternidade. De uma esposa "amantíssima", dedicada ao lar e à religião, e o que nos parece é que Clarisse não era bem assim, era uma mulher originalíssima, surge a mulher de bronze, símbolo de sua época. O seu busto se encontra no Largo dos Leões –Botafogo/ Rio de Janeiro, foi o primeiro monumento a uma mulher real, erguido simbolicamente para apaziguar e superar a morte. Esculpido por Honório Cunha Melo, apresenta duas características: o rosto voltado para baixo, como se ela estivesse nos olhando, com superioridade e altivez. Ao mesmo tempo é um olhar piedoso e compreensivo. A segunda, os anjos que ornam a sua roupa. Anjos, que segundo sua neta Clarisse de Oliveira, estavam presentes em todos os seus móveis, objetos pessoais e que fariam a transição delicada da vida mundana de Clarisse para o céu.

Curiosamente, a exemplaridade de Clarisse foi caracterizada de maneira distinta, no busto à do grupo escultórico de mámore que adorna o seu túmulo no cemitério São João Baptista. Neste, ela aparece de corpo inteiro, vestida de modo aristocrático, com o seu colar de pérolas preferido, que hoje está guardado por sua neta Clarisse. Aos seus pés estão ajoelhados um casal e uma criança, como se recebessem da ilustre senhora uma benção ou uma esmola. A cena foi inteiramente construída por seu marido para exaltar a posição de Clarisse na sociedade de sua época. Este fato nos faz desconfiar que se não fosse a tragédia de sua morte, a sua originalidade e ousadia jamais seriam reconhecidas entre os seus pares. No espaço horizontal e hieráquico do cemitério, a Clarisse de mármore foi representada para destacar-se dos seus iguais.

Os iguais aqui não são os necessitados, mas aqueles que pertenciam a sua classe social. A Clarisse de bronze, ofertada à cidade pelos “pobres”, não pertence mais a nenhum grupo social, ela é uma imagem de mulher destinada a todos.

domingo, 13 de abril de 2008

Clementina

Clementina de Jesus é a prova de que quando a gente tem um dom e ele é universal, como a musica, nem que demorem 65 anos de vida ele aparece e passa a brilhar, merecidamente. Sua vida e a música, se cruzam como os fios da seda, para compor uma vida.

sábado, 12 de abril de 2008

Elas fizeram a História

Esta semana, vamos falar de Emancipação da mulher no Brasil, lembrando para os leitores do Bolsa de Mulher que existiram muitas almas femininas que foram fundamentais para a nossa história e que ainda permanecem desconhecidas dos livros oficiais. Esta situação começou a ser redimida pela publicação do Dicionário de Mulheres do Brasil – de 1500 até a atualidade, Jorge Zahar Editor, organizado pela Rede de Desenvolvimento Humano (Redeh), uma organização não governamental, chefiada por mulheres, cuja pesquisa realizada em todos os estados do Brasil, mergulhou no passado para resgatar a vida de mulheres famosas e anônimas.

Voltando no início de nossa historia... poderíamos dizer que se não fosse a portuguesa Inês de Souza, com apenas 16 anos, a cidade do Rio de Janeiro não estaria nos mapas e teria sucumbido a invasão francesa. Mulher do Governador da Capitania, Salvador Correia de Sá – 1578 à 1598, foi responsável pela defesa da cidade quando houve um ataque de três navios corsários, que vieram saquear e incendiar a cidade. A estratégia de defesa de D. Inês foi o máximo, vestiu muitas mulheres com armaduras masculinas, que simularam na praia alguns movimentos militares, afastando os franceses da cidade.

Outra personagem interessante foi Ana Pimentel, Governadora da Capitania de São Vicente em 1534. Nascida de família nobre espanhola, casou-se cedo com Martim Afonso de Souza, teve seis filhos e veio para o Brasil, como procuradora de seu marido para assumir algumas terras da Capitania de São Vicente, nada mais nada menos do que hoje é conhecido como a cidade de São Paulo. Acompanhada por uma armada real, sua viajem durou três anos, e aqui chegando logo providenciou a nomeação dos comandantes que iriam ajuda-la a ocupar as terras. Incentivou o cultivo de laranja com o objetivo de eliminar o escorbuto, doença provocada pela falta de vitamina C, que atacava os navegantes portugueses durante o caminho para cá. Também estimulou o plantio do arroz, do trigo e o cultivo de gado na região .

Vejam algumas datas importantes para a emancipação política da mulher no Brasil:

1852 – é lançada a primeira publicação exigindo o acesso à educação para as mulheres, o Jornal das Senhoras, Rio de Janeiro.

1881 - pela primeira vez, as moças conquistam o direito de entrar nas faculdades de Medicina. Este caminho foi aberto por Maria Augusta Generoso Estrella, que
teve de estudar nos Estados Unidos, no New York Medical College and
Hospital for Women, porque o acesso às faculdades brasileiras era vetado
paras mulheres. Ela se formou em 1882 e seu caso serviu como pressão publica.

1910 - sob o comando da professora Leolinda de Figueiredo Daltro, é
organizado o Partido Republicano Feminino que lutava pelo direito ao voto. Desejo realizado somente 22 anos depois...

1922 - no Rio de Janeiro, é realizado o primeiro Congresso Feminino
Brasileiro, sob a batuta de Bertha Lutz, sobre ela falaremos na próxima edição do História feminina.

1929- a capixaba Emiliana Viana Emery conquista, na Justiça, o
registro eleitoral e o direito ao voto. Foi um escândalo!

1932 - O presidente Getúlio Vargas concede às mulheres alfabetizadas o
direito de voto. Depois do Equador, o Brasil foi o segundo país da América
Latina a outorgar o direito. Vejam só, antes da França.

1934 - A Constituição Federal assegura igualdade política para as mulheres e os homens, conquista excluída da Carta de 1937, quando da imposição do Estado Novo.

1962 – Com a mudança no Estatuto da Mulher Casada, a esposa
deixa de ser tutelada pelo marido e pode decidir sobre a própria vida, ganhando até CPF. Imagina como elas faziam as compras??

1985 - Surgem as primeiras Delegacias da Mulher, chefiadas por delegadas e policiais mulheres. Uma conquista fundamental pois é hoje um instrumento fundamental para a defesa contra os maus-tratos e agressões contra as mulheres e crianças.

1988 – A “bancada do batom” assegurou igualdade para homens e mulheres
na chefia das famílias. Os principais direitos já estão na letra da lei.

sexta-feira, 11 de abril de 2008

Eugenia

Em dezembro, a coluna História feminina completa um ano de vida. A mulher brasileira foi a personagem principal deste ano e, através de muitas histórias, revelamos como ela conquistou a cidadania, o direito à palavra escrita, a uma beleza própria e livre, ascendendo de maneira surpreendente ao universo das artes. Isto sem falar da maior vitória de todos tempos de história feminina: estar definitivamente participante do mundo do trabalho, onde preconceitos e tabus sexuais ainda estão sendo superados. Este mês, a homenagem é para o nosso time do Bolsa de Mulher, que desde que está no “ar” vem provocando e instigando o público feminino. Uma homenagem que se realiza de maneira histórica, como é a tarefa desta coluna, trazendo à luz a memória de mulheres muito inteligentes, melhor ainda espertas e livres: as jornalistas. Desde que surgiu no Brasil, o jornalismo feminino tem sido um canal fundamental de educação e ampliação de nossos sentidos.Viva estas mulheres que nos colocaram nas manchetes de um novo tempo!

Como é de praxe, comecemos pela primeira repórter que se tem notícia nos jornais, Eugênia Brandão, conhecida mais tarde como Eugênia Álvaro Moreira. Mineira de Juiz de Fora, nasceu em 1898 e veio para o Rio menina no início do século XX. Nesta época, a imprensa só admitia mulheres atuando como folhetinistas e poetisas. Quando a redação do Jornal A Rua, no Rio de Janeiro, aceitou que Eugênia ocupasse o cargo de repórter provocou reações de espanto generalizado em toda a sociedade.

O sucesso como "reportisa", neologismo criado para ela, só aconteceu em 1914, quando emplacou uma matéria de capa no jornal Última Hora. A sua estratégia foi bárbara: primeiro noticiou que deixaria o jornalismo para entrar em um convento, o Asilo Bom Pastor. A notícia causou furor: porque uma mulher tão bonita estaria deixando a vida mundana: seria por uma desgostosa paixão? Misticismo? Depressão? Aproveitando-se do fato de ser mulher, penetrou no asilo para entrevistar a irmã de uma mulher assassinada, no crime conhecido como "A tragédia da rua Dr. Januzzi, 13". Como nenhum outro repórter desconfiou da trama, suas reportagens chegaram ao público de modo inédito causando um enorme sucesso.

Pouco tempo depois, a revista Careta louvou a audácia e a beleza de Eugênia em linguagem caipira: "Apareceu aqui no Rio/ um jorná que chama Rua/ um jorná que sae a noite/ quando está nascendo a lua/ (...) Tem uma moça bonita/ que o cabelo traz cortado/ Usa chapéo como os home, / tem cada um oito damnado".A reportisa também faria parte da redação de dois grandes jornais da época, A Notícia e o País.
Com vinte e poucos anos casou-se com o escritor e também jornalista Álvaro Moreira, com quem teve seis filhos. Em sua casa, recebia intelectuais e militantes políticos de esquerda, principalmente do Partido Comunista. Eugênia era uma das principais vozes do movimento feminista brasileiro e mensalmente criava campanhas a favor do voto feminino. Sua participação política também se estendia às artes e Eugênia foi uma das musas do movimento modernista carioca. Junto com o marido provocou uma renovação no teatro brasileiro, montando peças de autores contemporâneos e baseados na realidade do dia-a-dia, ao invés de tragédias gregas.

Em 1935, funda a União Feminina do Brasil, grupo feminista do Partido Comunista do Brasil, que se uniria a Aliança Nacional Libertadora para compor a frente anti-fascista no Brasil.

Durante o Estado Novo fez uma campanha para libertação da filha de Olga Prestes, Anita Leocádia, e a devolução da neném ao Brasil. O movimento ganhou caráter internacional e a criança foi entregue por Hitler ao governo de Getúlio.

Eugênia foi uma mulher lindíssima. Fumava com cigarros com piteira e charutos em praça pública. O cabelo deliciosamente curto e sempre coberto por um chapéu. Ao desafiar os costumes da época, inventava um novo conceito de beleza feminina. Apesar de ter-se candidatado à deputada federal em 1945, não foi eleita.
Morreu três anos depois, no dia 16 de junho, com 50 anos.

Como veremos nas próximas matérias, poucas mulheres chegaram às redações de jornais até a obrigatoriedade do diploma para o exercício da profissão, em 1969. E, mesmo depois, a maioria se concentrou em publicações dirigidas ao público feminino. Só no final dos anos 70 se iniciou a invasão, visualmente incontestável dos, então, feudos masculinos.

Hoje, nós estamos em toda a parte: nos jornais, revistas, assessorias, rádios e tevês e ocupam todos os postos, sem exceção.