segunda-feira, 28 de abril de 2008

Adalgisa Néri

Jornalistas sim, mas primeiro poetas. No século XX as mulheres que conquistaram espaço na imprensa tinham que ser um algo mais do que apenas repórteres de notícias. Adalgisa Néri acumulava o dom para política com a ousadia sedutora de uma grande poeta, conquistando muitos corações, dentre eles o de Getúlio Vargas, com quem teve um affair.

A Deusa, como era chamada por Carlos Drummond de Andrade, nasceu com o nome de Adalgisa Maria Feliciana Noel Cancela Ferreira, no dia 29 de outubro de 1905, Rio de Janeiro.

Aos dezesseis anos casou-se com o pintor e poeta paraense Ismael Néri, por quem era absolutamente apaixonada. Seu casamento era tecido com a poesia de ambos, e em sua casa, recebiam os mais importantes intelectuais e poetas brasileiros da década de 20. Vítima de tuberculose, Ismael Néri morreu em 1934, deixando-a viúva e totalmente arrasada.

Em 1935, dedicou-se a carreira literária e ao jornalismo, na Revista Acadêmica. Neste mesmo ano publica seu primeiro livro, poemas, elogiadíssimo pela crítica. Sobrevivia de artigos, crônicas e traduções, para a José Olympio Editora.
Sua beleza era famosa pelo Brasil e Adalgisa possuía muitos pretendentes, dentre eles o maravilhoso poeta mineiro Murilo Mendes. Apesar disto, casou-se com Lourival Fontes, o chefe do poderoso Departamento de Imprensa e Propaganda -DIP, do Estado Novo. Além de horrendo, Lourival era o responsável pela censura nas artes e assumia publicamente ser um homem de direita. Não obstante considerar-se uma artista de esquerda, Adalgisa esteve casada com ele por 14 anos, e colaborava intensamente o DIP, tornando-se a diretora social da instituição e sendo responsável pela área de relações públicas. Quando Lourival foi nomeado embaixador no México, Adalgisa fez o maior sucesso na elite cultural deste país, tornando-se amiga dos pintores Frida Khalo e Diego Riviera. O casamento terminou em 1953.

Separada, começou sua carreira política, escrevendo para o jornal Ultima Hora a coluna diária Retrato sem toque . Neste jornal, sob a proteção de Samuel Weiner, por 12 anos, defendeu o nacionalismo, atacou personalidades sociais e poderosos políticos, e insistentemente denunciou os subornos do dono dos Diários Associados, Assis Chateaubriand. Em reação a ela, Assis publicou na primeira página do Diário da Noite, uma crítica chamando-a de "cinqüentona devassa, infiel ao corpo, à alma e à decência conjugal”, fazendo referência aos inúmeros casos que a jornalista teve durante os seus casamentos.

Em relação a sua vida amorosa, o caso mais chamativo foi com o presidente Vargas. Adalgisa chegou a dar o endereço do Palácio do Catete para correspondência pessoal.
Em virtude do sucesso da coluna, elegeu-se deputada pelo Partido Socialista em 1960 e 1966, combatendo regionalmente Carlos Lacerda. Apesar de ter sido reconhecida sua honestidade e integridade política, foi cassada pelo AI-5. Ana, sua biógrafa, nos diz que "Ela não tinha medo de brigar com ninguém; quando a cassaram, a Marinha exigiu a devolução da medalha de honra ao mérito."

Após a cassação, Adalgisa viveu em profunda depressão, falecendo em 1980, aos 74 anos, num asilo, Estância São José. As últimas mensalidades do quarto com direito a refeições, foram pagas por Flávio Cavalcanti, seu amigo no fim da vida. Adalgisa havia sido jurada no programa de auditório de Cavalcanti.

Famosa por sua beleza, Adalgisa legou para nós poesia de muita sensualidade, como esta, dedicada as amantes:

“Eu te amo
Antes e depois de todos os acontecimentos
Na profunda imensidade do vazio
E a cada lágrima dos meus pensamentos.
Eu te amo
Em todos os ventos que cantam,
Em todas as sombras que choram,
Na extensão infinita do tempo
Até a região onde os silêncios moram.
Eu te amo
Em todas as transformações da vida,
Em todos os caminhos do medo,
Na angústia da vontade perdida
E na dor que se veste em segredo.
Eu te amo
Em tudo que estás presente,
No olhar dos astros que te alcançam
Em tudo que ainda estás ausente.
Eu te amo
Desde a criação das águas,
desde a idéia do fogo
E antes do primeiro riso e da primeira mágoa.
Eu te amo perdidamente
Desde a grande nebulosa
Até depois que o universo cair sobre mim
Suavemente.

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