quinta-feira, 17 de abril de 2008

Chica

Encerrando o mês e setembro, que dedicamos às mulheres que por simbolizaram a nossa terra, vamos falar de uma negra esfuziante, que nascida escrava brilhou no Brasil Colônia, tornando famosa uma das mais bonitas cidades do Brasil – Diamantina. Chica da Silva exerceu tal influência em sua época, que comprou a sua alforria, possuiu a casa mais bonita de sua cidade e mais de 100 escravos, além de ajudar a subvencionar, a Inconfidência Mineira.

Filha de uma negra, Maria da Costa, e um branco, Antônio Caetano de Sá, a escrava Chica da Silva nasceu pertencendo a Manoel Pires Sardinha, com quem teve eu primeiro filho, Simão, em 1751. Juiz e Presidente do Senado da Vila do Príncipe, Sardinha estava impedido de assumir a paternidade do filho, mas concedeu-lhe alforria quando o menino foi batizado.

Francisca Parda, como era conhecida, foi libertada a pedido do Desembargador João Fernandes de Oliveira, que chegara ao arraial do Tejuco em 1753 para exercer o cargo de contratador que o pai, que tinha o mesmo nome, conquistara junto à Coroa treze anos antes. A região era a mais cobiçada da colônia portuguesa, pois ali, desde 1729, foram descobertas as minas de diamantes. O contratador era o homem que cobrava os tributos relativos a exploração desta pedra preciosa e era a única pessoa autorizada a exporta-la.

Em 1754, Chica foi viver com este homem poderoso. No ano seguinte já tinha um sobrado e de maneira muito própria, foi inserindo-se na vida livre da cidade, incorporando os costumes portugueses, comprando bens de maneira a se sentir respeitada e intervindo na cultura local, como por exemplo, mandando construir ao lado de sua casa uma igreja e um teatro, onde recebia os seus convidados. Durante o seu casamento, que durou quinze anos, teve 13 filhos, nove mulheres e quatro homens.

A média de um filho a cada treze meses nos faz crer que sua fama de mulher extremamente sedutora, lasciva e devoradora de homens não seja bem verdadeira. João Fernandes, por sua vez, reconheceu todos eles, legou-lhes o seu patrimônio. Apesar de não poder se casar com Chica da Silva, pois era proibido o casamento entre o homem branco e a mulher negra, fez de tudo para que vivessem uma vida familiar autêntica, honrando seus filhos e sua mulher. Chica tinha todos seus desejos atendidos pelo amante. Como não conhecia o mar, João Fernandes mandou construir em sua chácara, que não era a sua resdência, no bairro da Palha, um barco com capacidade para dez pessoas. O navio, com mastros e velas, navegava no lago da chácara junto com uma orquestra particular que embalava as recepções.

Chica tinha a conduta de uma mulher de elite. Educou suas filhas na melhor escola da cidade e as preparou para um bom casamento. Embora tivesse ganho prestígio a partir de sua relação com o contratador, foi uma espécie de mecenas, protetora das artes locais, incentivando desde pintores, para quem mandou construir uma escola destinada a ensinar a pintura religiosa, até os homens letrados, financiando pequenas publicações.

Gastava seu dinheiro também com os homens pobres, principalmente os seus escravos, financiando casamentos, batismos e enterros. Todavia, não os libertava e mantinha-os sob o julgo do seu poder.

Em 1770, João Fernandes foi obrigado a voltar para Portugal para prestar contas de sua atuação como contratador e rever o testamento deixado pelo pai, determinando o afastamento definitivo entre os dois. A preocupação de Chica então voltou-se exclusivamente para o futuro das filhas. Passou a fazer das principais irmandades religiosas da cidade, como a de São Francisco, Carmo (exclusiva de brancos), Mercês (de mulatos) e Rosário (negros).

A imagem de Chica da Silva que se tornou popular foi a de uma mulher imoral, que se utilizava de sua beleza para conseguir o que queria. No entanto, este é um estereotipo, pois como já dissemos antes, não seria possível manter uma aparência sedutora com tantas maternidades. A primeira vez que Francisca da Silva apareceu como uma personalidade histórica, foi nos textos de Diamantina publicados pelo historiador Joaquim Felício dos Santos. Segundo ele, que chegou a recolher depoimentos de pessoas que conviveram com Chica, ela não correspondia nem um pouco a esta imagem: "(...) não possuía graça, não possuía beleza, não possuía espírito, não tivera educação, enfim não possuía atrativo algum que pudesse justificar uma forte paixão", diz. Já Nazaré de Menezes diz o contrário: "poderia ser grosseira, mas nunca odienta e asquerosa (...) não fosse não teria inspirado paixão tão ardente e duradoura".

Bonita ou não, o fato é que Chica da Silva, venceu soberanamente uma sociedade preconceituosa, como poucas mulheres de sua época conseguiram fazer em todo o mundo. Morreu em 1796 e foi enterrada na igreja de S. Francisco de Assis, privilégio reservado apenas aos brancos ricos da região.

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