quarta-feira, 16 de abril de 2008

Chiquinha

Ó abres alas!
Que eu quero passar
Eu sou da lira
Não posso negar....

A vida da Maestrina Francisca Gonzaga já foi contada e cantada de diversas maneiras. A importância desta compositora foi reconhecida já em vida e hoje Chiquinha Gonzaga e suas músicas são consideradas um passado vivo e fundamental para a Música Brasileira.

Nascida na cidade do Rio de Janeiro, em 17 de outubro de 1847, filha de um oficial do exército com uma mestiça, Francisca Edwiges Gonzaga, foi educada em casa por um cônego. Além da alfabetização e leitura, do cálculo e do catecismo, o professor ensinou a Chiquinha alguns idiomas estrangeiros.

Como complemento a formação social, José Basileu ,seu pai, contratou um maestro de piano para dar aulas a filha. O que deveria ser apenas uma prenda doméstica, o estudo do piano transformou-se para Chiquinha Gonzaga no motivo de sua vida. Tanto que no casamento em 1863, aos 16 anos, com Jacinto Ribeiro do Amaral, o piano foi o dote e o principal responsável pela separação do casal. Mesmo com dois filhos, Chiquinha preferia dedicar-se ao piano, do que aos afazeres do casamento.

Tentando separar a mulher do instrumento, Jacinto obriga Chiquinha a fazer uma viagem com ele para o Paraguai, pois sua família era dona dos navios alugados ao governo brasileiro durante a guerra. Separada do piano, Chiquinha foi juntar-se aos negros escravos nos porões do navio, onde aprendia as melodias e ritmos africanos. O marido, não suportando mais esta situação pede a mulher que opte entre ele e a música, ao que ela responde: Sinto muito, mas não posso viver sem harmonia !

Renegada pelos pais, Chiquinha se estabelece na cidade como professora de piano. Joaquim Callado, criador do gênero musical conhecido como choro, adotou-a logo após a sua expulsão e ela passou então a freqüentar o universo boêmio da cidade. Em 1869 Callado dedicou-lhe uma polca, a primeira composição do músico editada, intitulada Querida por Todos, que segundo Edinha Diniz , sua principal biógrafa.

"Mais que uma recepção calorosa, ou até mesmo carinhosa, como o título sugere, Querida por Todos representou um salvo conduto para a introdução de Chiquinha no meio musical. O apadrinhamento declarado assim por Callado, músico respeitado, abria as portas daquele ambiente para a jovem novata e pianista.".

Embora cortejada pelo músico, Chiquinha se entregou a uma paixão pelo jovem João Baptista de Carvalho, rico engenheiro , freqüentador da casa dos Gonzaga, e passou a viver com ele. Apaixonado pela vida e pelas mulheres, João Baptista será o grande amor da vida de Chiquinha, mas o mais sofrido também. Concorria para a desgraça da relação, a queda do rapaz pelas mulheres e a forte repressão da sociedade em relação ao concubinato. Sair do Rio era aparentemente a única maneira de resolver estes problemas, e por duas vezes o casal foi morar na fronteira com Minas Gerais. Mesmo afastado da vida boêmia, João Baptista mantinha seus casos com mulheres, o que em 1876 levou Chiquinha abandoná-lo e a filha Alice Maria, de apenas meses de idade. Mais uma vez, fugia do casamento com o filho mais velho, e deixava para trás outro bebê. O destino de Alice Maria não foi diferente do de seus irmãos, foi criada por um parente da família de João Baptista.

Ao retornar para o Rio, Chiquinha Gonzaga se reaproxima de Callado e passa a ser pianeira do seu grupo de música, chamado Choro Carioca. O pianeiro, era um pianista que sem possuir o estudo completo do instrumento, acabava por improvisar na música. O choro era principalmente tocado nas festas domésticas, como os batizados, onde não faltavam boa comida e bebida.

Foi numa destas festas de choro, que Chiquinha apresentou ao grupo de cavaquinhos e violões sua primeira melodia, que por ter sido rapidamente aceita e assobiada por todos, foi intitulada "Atraente". Quando esta música foi editada Chiquinha tinha 29 anos de idade. Era jovem, bela e livre. Seus contemporâneos registraram alguns dos seus atributos femininos: sedutora, formosa, insinuante, sensual, faceira. Chegaram a defini-la como uma cabocla estonteante.

O sucesso trazia consigo uma reação negativa da sociedade. Curiosamente, as quadrinhas e paródias maliciosas faziam uma analogia entre o título da polca e a compositora, e nesta época uma mulher não podia ser atraente, nem tão pouco conviver diretamente com a boemia. A hostilidade em relação a Chiquinha era muitas vezes estimulada pela própria família. Freqüentemente, o moleque contratado por ela para vender suas partituras nas ruas, era molestado por pessoas que se diziam amigos dos Gonzaga, que rasgavam todas as partituras carregadas por ele, dando enormes prejuízos à compositora. O fato é que Chiquinha não se intimidou, produzindo e editando partituras incessantemente.

Foi com o teatro de revista que Chiquinha conquistou um lugar definitivo na música popular. O teatro de revista foi um fenômeno importante na educação musical das camadas mais pobres. Nele eram narrados de maneira cômica os acontecimentos do ano. E foi musicando em 1885 o libreto chamado "A Corte na Roça ", que Chiquinha Gonzaga estreou como Maestrina. É preciso dizer que a idéia de uma mulher musicar uma peça, uma atividade até então restrita aos homens criou embaraços na época. Por outro lado, título de Maestrina era uma compensação para os sofrimentos que a opção pela música lhe dera.

Chiquinha não parou por aí: foi ainda ela que promoveu o grande encontro entre o carnaval e a música urbana. Antes da sua composição o Abre-alas, não havia canções carnavalescas cantadas na rua. Este samba inventou os queridos blocos de carnaval do Rio.

Os últimos anos de sua vida ainda lhe trariam surpresas, e por meio da mulher do Presidente Hermes da Fonseca, a música de Chiquinha Gonzaga seria tocada no Palácio do Catete. Nair de Teffé, ouvira de seu amigo Catulo da Paixão Cearense que a música nacional não habitava o palácio de governo. Sensibilizada com o fato, incluiu na programação da noite do dia 26 de dezembro de 1914 o Corta Jaca, que ritmicamente era considerada uma das mais audaciosas composições de Chiquinha Gonzaga.

No dia seguinte, os jornais imprimiam matérias relatando o espantoso evento. Muitos deles foram negativos ao fato de a música popular invadir o Palácio.

Maestrina consagrada, Chiquinha irá viver os anos seguintes de sua vida, musicando, criando novas peças e apoiando com o seu prestígio a publicação das músicas de novos compositores, como foi o caso de Luiz Peixoto (1889-1973). Aos 87 morre em sua casa na Praça Tiradentes, em plena terça-feira de carnaval, 28 de fevereiro de 1935.

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